Desabafos & DiscussõesLuiza Moura

As mágoas digitais

Ao longo dos anos, as pessoas sempre criaram suas formas de se comunicarem, porque é uma necessidade primordial do ser humano. Não há como ter um relacionamento saudável ou cordial sem a boa comunicação. Seja dialogando, com gestos, com uma buzina no trânsito, gravando áudios no WhatsApp, curtindo fotos nas redes sociais, comentando, compartilhando ou até mesmo enviando figurinhas.

As redes sociais, sem dúvida, é o meio de comunicação mais utilizado em nossa atualidade. A acessibilidade permite que troquemos figurinhas em um segundo com um amigo do Japão, por exemplo. Por esse motivo, mesmo que não percebamos, permitimos que elas definam muitas coisas em nossas relações. “Se alguém não me segue de volta é porque não gosta de mim”, “Se fulano não visualiza e nem comenta os meus stories é porque não sou importante para ele” ou “Se não sou lembrado virtualmente devo não ter valor algum”, é um mundo de sensações que nunca tem fim. Pode ser que em algumas dessas sensações haja um fio de verdade, mas pense bem, por que isso é tão importante a ponto de reger suas emoções?

Só sigo quem me segue

Outro dia, assistindo o trecho de um programa de fofocas, vi o apresentador anunciar a seguinte notícia: “Fulana de tal deixou de seguir Sicrana de Tal no Instagram”, e isso era uma “Bomba”. Óbvio que se tratando de um programa desse segmento, é normal que as notícias sejam sensacionalistas. O fato é que isso vem se naturalizando nas relações pessoais, e se tornando uma forma de dizer: “Eu não te sigo, te excluí das minhas relações” ou simplesmente não aconteceu nada disso. As mídias sociais são tão relativas quanto as pessoas.

Lembro de uma vez em que desativei meu Facebook, e duas pessoas vieram se queixar no WhatsApp afirmando que eu havia as bloqueado. Descobri isso quase um ano depois após a reativação, e elas passaram todo esse tempo magoadas comigo. Sem falar daquelas que nem chegam a dizer nada e ainda devem estar magoadas.

O antes e o depois

Quando eu tinha dez anos de idade, recordo que escrevia cartas de amor a pedido de uma senhora idosa. Minha tia havia dito a ela que eu tinha uma letra muito boa, então ela me contratou. Cada carta me rendia 1 real. Ela narrava aquelas palavras com os olhos brilhando, talvez pensando na expectativa da pessoa ao recebê-la. A memória desse tempo, em que muitos não haviam nascido, pode sim remeter às dificuldades de se comunicar com pessoas distantes, porém, não havia essa superficialidade dos contatos atuais. Parece que o mais se tornou menos. Quem nasceu nos anos 80, por exemplo, sabe exatamente o que estou falando porque conseguimos comparar o antes com o depois. Sem contar com aquilo que você já deve ter lido ou ouvido, sobre a substituição da presença das pessoas de perto pela atenção do aparelho celular. O que no começo pode parecer um laço de aproximação, se não for mantido segundo os critérios pessoais de quem usa, acaba por se tornar um mar de sensações que em sua grande maioria é negativa.

Como o celular e a internet, se tornaram o principal meio de se relacionar, — da família aos negócios, da amizade ao grupo espiritual — então, criamos um problema que não depende só de nós. “Ah, quer dizer que vou ter que quebrar o celular para me relacionar bem ou apagar minhas mídias digitais?”, se houver se tornado um vício eu responderia “Sim! Sua saúde mental é mais importante que a vida digital, mesmo que não pareça”. No geral “Não! Não é questão de quebrar ou sumir”, mas precisamos encontrar um equilíbrio para viver bem e não deixar que isso determine quem somos. Imagino que alguns não concordem “Que a internet não revela nem 10% do que as pessoas realmente são ou como se sentem”, mesmo quando elas expõem demais ou de menos suas vidas, sentimentos e cotidiano. (Sem esquecer que não é um lugar seguro).

Expectativas mil

A Expectativa é um gatilho que pode liberar flores ou espinhos, e é nela que se concentra todo esse mundo de sensações que temos diante do cotidiano e das comunicações virtuais. Às vezes você gera expectativas que são só suas, e não obtendo o retorno esperado, dá lugar a sensações negativas. Seja a foto de um bolo que fez no domingo, um produto que esteja vendendo ou alguma apresentação artística. Digo isso porque trabalho divulgando meus livros e confesso que o retorno que tenho não provém de família ou amigos, na verdade quase nenhum estão interessados em ler meus textos. Agora, imagine você se eu vou desistir de escrever ou viver magoado por causa dessa “expectativa frustrada”? Não. Eu vou em busca do meu público-leitor, e fazer o meu trabalho porque é isso que eu sou.

Muitas das suas inquietações, não todas, no que diz respeito às comunicações virtuais podem estar sendo geradas por essas expectativas. É como se apaixonar por alguém que não corresponde, talvez um pouco menos. Às vezes a outra pessoa, àquela que acusamos de abandono, falta de reciprocidade ou parceria, não tem culpa do que ocorre em nossos sentimentos. Ela apenas não corresponde às nossas expectativas. “Maria não me convidou para o churrasco e postou fotos com outras amigas”, será que Maria fez esse churrasco só para você se sentir assim? Ou será que ela esqueceu, ou que talvez não a considere da mesma maneira, e que se isso for verdade seria melhor você seguir com a sua vida? Sem mágoas, óbvio.

Mensagens visualizadas e não respondidas; banalização de um projeto pessoal; amiga desfez amizade; não foi convidado a participar do vídeo institucional da empresa, vítimas de indiretas da ex-chefe; não te chamaram para o rolê. São muitas as mágoas que a comunicação virtual pode produzir se não aprendemos a diferenciar o que é de verdade e o que não é.
Seja de verdade

Imagino que após ler esse texto, muitos não resistirão ao desejo de ver quantas curtidas teve naquela última foto, as pessoas que curtiram e se alguém específico curtiu, ou conferir no WhatsApp se aquela pessoa resolveu responder. Tudo é muito relativo mesmo, e o perigo é que achamos que essas sensações que a comunicação produz são absolutas. E mesmo que você tenha razão naquilo que cobra como reciprocidade, o que pretende fazer com isso? Viver nesse oceano de mágoas, rompimentos e novas aberturas?

É provável que sempre haja algum desencontro de expectativas nos relacionamentos, sejam físicos ou virtuais, por isso busque o que há de verdade em você e não limite as “certezas da vida” pelo o que as mídias sociais te fazem sentir. Ainda que seja seu principal meio de comunicação e a forma de estar conectado com as pessoas, por uma série de fatores como a distância (principalmente em tempos de pandemia), não permita que essas sensações definam o que realmente lhe pertence e o que tem valor. Vai viver a sua vida derrotada pela tecnologia? Se preciso, afaste-se um pouco dela, faça algo por você de verdade como ler um bom livro, ouvir uma música na vitrola, observar o fim do dia ou convidar alguém real para tomar um sorvete. Sem levar o celular, ok!?

(Esse texto é de Marcos de Sá, que nasceu em Fortaleza, em 1986. É escritor de romance contemporâneo, e seus livros de lançamento são “Reciclável – Acomode-se ou Recicle-se” e “O Baú de Shailo”, mas também escreveu um livro infantil intitulado “Rotulândia”, além de crônicas e alguns textos para a coluna Desabafo & Discussões da Revista Entre Poetas e Poesias. Educador social e idealizador de projetos voltados à leitura, como o “Periferia que lê”, “Leitor Book Brasil” e “Prêmio Book Brasil”. Já participou da dramaturgia de peças teatrais como “As 7 farsas da enganação” e “0,45 centavos a peça” dirigidas por renomados diretores como Pedro Gonçalves e Murillo Ramos, respectivamente. Além de atuar nas mesmas, também atuou e cantou em outras como “Labirinto”, “A Farsa da mal amada” e “A decisão”. Estudou teatro e dramaturgia nos anos de 1998, 2017 a 2019. Hoje dedica-se às suas obras literárias e projetos sociais.)

Participe também dessa coluna! Envie o seu texto (de desabafo ou reflexão) para o email lmsn_91@hotmail.com ou entre em contato pelo instagram @luiza.moura.ef. A sua voz precisa ser ouvida! Juntos temos mais força! Um grande abraço e sintam-se desde já acolhidos!
Luiza Moura.

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Luiza Moura

Luiza Moura de Souza Azevedo é de Feira de Santana. Enfermeira. Psicanalista e Hipnoterapeuta. Perita Judicial. Mestre em Psicologia e Intervenções em Saúde. Doutora Honoris Causa em Educação. PhD em Saúde Mental - Honoris Causa - IIBMRT - UDSLA (USA); Doutora Honoris Causa em Literatura pelo Centro Sarmathiano de Altos Estudos Filosóficos e Históricos. Possui MBA em gestão de Pessoas e Liderança. Sexóloga; Especialista em Terapia de Casal: Abordagem Psicanalítica. Especialista em Saúde Pública. Especialista em Enfermagem do Trabalho. Especialista em Perícias Forenses. Especialista em Enfermagem Forense. Compositora e Produtora Fonográfica. Com cursos de Francês e Inglês avançados e Espanhol intermediário. Imortal da Academia de Letras do Brasil/Suíça. Acadêmica do Núcleo de Letras e Artes de Buenos Aires. Membro da Luminescence- Academia Francesa de Artes, letras e Cultura. Membro da Literarte- Associação Internacional de Escritores e Artistas. Publicou os livros: “A pequena Flor-de-Lis, o Beija-flor e o imenso amarElo” e "A Arte de Amar. Instagram: @luiza.moura.ef

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