Suplemento Araçá – Vol.02 – nº03 – Set./2022 – Crônicas & Opiniões – “Você enxerga amarelo?” – Erica da Costa Barros
ISSN: 2764.3751
Você enxerga amarelo?
Erica da Costa Barros
Anita Malfatti, em 1917, com sua obra O Homem Amarelo, exposta na Semana de Arte Moderna, representa o excluído, marginalizado e invisível social. Amarelo, pálido, sem cor, sem força. O que não brilha, apático, emoldurado dentro de padrões que não lhe cabem. Incompleto, observado em sua falta, agonia. A pintura desperta o interesse do público por sua beleza ou pela agonia expressa no olhar do homem oprimido e reprimido?
Quantos homens amarelos passam por nós cotidianamente sem que os enxerguemos? Invisíveis, deitados nas calçadas, de mãos estendidas, gritando por socorro, muitas vezes silenciosamente, apenas com a súplica de um olhar. Não estão em um quadro, mas estão expostos e não paramos para olhar com a atenção merecida.
E os homens amarelos assassinados pela violência urbana, nos ônibus, metrôs, em suas casas, no trabalho? Alguns são coloridos no momento da morte, tendo a dor de sua família e o triste fim espetacularizados por um instante. Depois, voltam ao esquecimento, à palidez, à invisibilidade que produziram novos seres amarelos, em um ciclo social desumano e cruel.
Homens amarelos estão por aí, em nossa casa, nas ruas, nos diferentes centros sociais, nas igrejas, nas escolas, em toda parte, se olharmos com atenção os veremos. Às vezes, estão nas telas de cinema, nos palcos dos teatros, nas obras expostas nos museus para que os coloridos possam enxergá-los por um instante, até se comoverem, para então saírem da contemplação e voltarem às suas vidas. E assim o homem amarelo segue, perde sua cor, retorna à palidez.
Os quadros estão expostos no dia-a-dia. Precisaremos de outra Anita Malfatti para que nos conscientizemos sobre a existência dos homens amarelos que habitam a sociedade da qual fazemos parte? Continuaremos a enquadrar todos os seres em padrões homogêneos e discursos meritocratas para aliviarmos nossa falta de atitude? Quando iremos pegar as tintas e os pincéis para a construção de um quadro mais colorido?
Encerro com questionamentos, em busca de reflexão, afinal estamos falando de arte e essa não tem o objetivo de dar respostas, mas provocar perguntas, isso a faz atemporal e necessária. Quem são os amarelos que nos rodeiam? Somos nós, em alguma esfera, os amarelos?
Deixo para o caro leitor as respostas, se as tiver.
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