Desabafos & DiscussõesLuiza Moura

Qual a cor da roupa que você vai passar este réveillon de 2020???? Branco, para chamar a paz? Amarelo para ter mais dinheiro? Verde, para esperança? Vermelho para um novo amor?…

10, 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2,1… Feliz Ano Novo, Feliz 2020!!!!!

Uhuuu!!!!! Mais um ano se inicia e com ele vários sonhos, metas, planos… Lá vem o carnaval, a páscoa, tantos feriados legais pra gente viajar, curtir a vida e o São João?! Ah, como amo as festas juninas, as comidas, as músicas dessa época, os forrós… não vejo a hora de chegar todas essas festas, esses feriados…

E de repente…. só que não!!!!

E de repente fomos pegos de surpresa por um inimigo invisível, um inimigo que simplesmente nos fez reféns de nós mesmos, um inimigo que nos ameaça diariamente, que tem levado nosso amigos e parentes, profissionais da área de saúde, profissionais da área de desinfecção e tantas pessoas desconhecidas para leitos hospitalares e a ficarem tantos dias fora de casa, a ficarem afastados dos seus, mesmo dentro de casa, para não contaminar os que amam….

E de repente um parente seu se contamina com o COVID-19, é internado, piora, vai para um leito de UTI, é intubado, passa de 2 a 3 semanas naquele estado desesperador. E essa família dia a dia se dilacera, se desespera, fica no aguardo de um boletim médico animador, ou de um telefonema dizendo que tudo acabou…. Mas eis que esse parente tão amado vai se recuperando e consegue sair do isolamento hospitalar e ir para o isolamento de seu lar. Meu Deus, que notícia maravilhosa, estamos com quem amamos dentro de casa, mas e agora? Essa família está completamente insegura e destruída emocionalmente, com muitas inseguranças em relação a essa nova pessoa que retornou. Como eles vão acolher um ao outro, que estrutura emocional essas pessoas têm? Como essa família pode dimensionar o que esse parente passou ali naquela UTI? Como esse parente pode imaginar o que essa família passou durantes esses dias sem fim? Simplesmente não podem.

E de repente alguém morreu. Causa morte – COVID-19. E a cerimônia de sepultamento? Oi? Não vai ter, vocês não vão poder se despedir dessa pessoa que tanto amam. Caixão fechado, enterro imediato. E esse luto como vai ser vivido?

Em certo tempo a nossa equipe médica decidiu usar fraldas geriátricas durante os plantões para não correrem o risco de se contaminarem ao ir ao banheiro, decidiram passar horas e horas sem tomar um copo d’agua para não ter vontade de “fazer xixi”. Essa equipe precisa dobrar plantões porque os colegas estão contaminados, e estão se expondo ou morrendo para salvar outras vidas.

E de repente o paciente morreu, chama um apoio policial para o médico dar a notícia aos familiares afim de que esse médico não sofra nenhuma agressão, como o colega ontem foi agredido fisicamente pelo parente desesperado que perdeu uma parte de si. E agora? O que fazer? Como agir? Como pensar? Como cuidar da nossa saúde emocional? E da saúde dos que amamos e dos que atendemos em nossas sessões de análises?

Então, cá estamos nós, psicanalistas, psicólogos, psicoterapeutas, “psis”…, diante dessa realidade desafiadora, diante desse susto. Como daremos conta de nossos pacientes? Essa nova realidade muda a natureza do nosso trabalho, também temos medo, também podemos estar no lugar das vítimas a qualquer hora, também vamos ter que colocar nossos sentimentos de lado e ajudar aquele ser humano que está em nossa frente ou àquela família que recebeu seu parente de volta, vítima desse vírus, porque essa família também não sabe o que fazer, como reagir ou o que pensar.

Nossos pacientes nos procurarão muito ansiosos, com insônia ou sono sem qualidade, pesadelos, flashbacks, humor rebaixado, déficit de memórias, frágeis e com muitos medos. Muitas vezes receberemos os heróis da saúde, destruídos porque perderam muitos pacientes ou colegas ou porque tiveram que escolher quem viver e quem morrer, ou porque foram acusados de assassinos ou porque a família está com medo de ser contaminada por eles.

Caros colegas, somos chamados à um grande desafio de amor e de amar, somos chamados a nos colocar no lugar das vítimas do COVID-19, a deixar a teoria que estudamos e aprendemos durante tantos anos do lado de fora da sala de análise ou do lado de fora das salas virtuais de atendimentos psicoterapêuticos e vivermos uma nova realidade desafiadora.

Nossa escuta terapêutica será muito mais aguçada, precisaremos reviver com o paciente a experiência da hospitalização, teremos que ouvir cada detalhe dessa experiência, cada dor, medo, insegurança. Utilizaremos novas técnicas, as escutas que utilizamos até agora não serão suficientes para essa nova realidade.

Já sabemos que para cada 1 (uma) pessoa contaminada pelo COVID-19 em estados moderados e graves, teremos 30-40 pessoas ligadas a esse paciente, que de alguma forma passarão por sofrimentos emocionais. Teremos pacientes com TEPT (Transtorno de Estresse pós-Traumático) após 20-24 meses depois que “tudo passar”. Sabemos também que no confinamento tudo que está dentro de nós e não foi resolvido, ecoa. Vamos ser reapresentados aos nossos medos, angústias, inseguranças e, infelizmente sabemos também que algumas “coisas” não vão passar…

Bom, não sei exatamente o que faremos e como faremos daqui por diante em termos de prática psicanalítica, sei apenas que somos chamados a ser agentes de esperança para essa nova humanidade que acaba de nascer!

(Esse texto é de Danielle Klein, Psicanalista clínica, infantil e didata. Professora da disciplina psicoterapia psicanalítica)

Participe também dessa coluna! Envie o seu texto (de desabafo ou reflexão) para o email lmsn_91@hotmail.com ou entre em contato pelo instagram @luiza.moura.ef. A sua voz precisa ser ouvida! Juntos temos mais força! Um grande abraço e sintam-se desde já acolhidos!

Luiza Moura.

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Luiza Moura

Luiza Moura de Souza Azevedo é de Feira de Santana. Enfermeira. Psicanalista e Hipnoterapeuta. Perita Judicial. Mestre em Psicologia e Intervenções em Saúde. Doutora Honoris Causa em Educação. PhD em Saúde Mental - Honoris Causa - IIBMRT - UDSLA (USA); Doutora Honoris Causa em Literatura pelo Centro Sarmathiano de Altos Estudos Filosóficos e Históricos. Possui MBA em gestão de Pessoas e Liderança. Sexóloga; Especialista em Terapia de Casal: Abordagem Psicanalítica. Especialista em Saúde Pública. Especialista em Enfermagem do Trabalho. Especialista em Perícias Forenses. Especialista em Enfermagem Forense. Compositora e Produtora Fonográfica. Com cursos de Francês e Inglês avançados e Espanhol intermediário. Imortal da Academia de Letras do Brasil/Suíça. Acadêmica do Núcleo de Letras e Artes de Buenos Aires. Membro da Luminescence- Academia Francesa de Artes, letras e Cultura. Membro da Literarte- Associação Internacional de Escritores e Artistas. Publicou os livros: “A pequena Flor-de-Lis, o Beija-flor e o imenso amarElo” e "A Arte de Amar. Instagram: @luiza.moura.ef

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