Tito Dassil

A LITERATURA COMO ATO DE RESILIÊNCIA – 2º ATO

O primeiro ato trata da literatura como um ato de resistência, que visa manter a humanidade viva, de pé. O segundo, da resiliência, da capacidade de se reinventar ao longo dos anos. No Brasil, o interesse em tornar-nos uma horda de leitores sempre foi duvidável, afinal, os efeitos do hábito de ler sempre foram olhados de soslaio pelo poder instituído, como um combustível perigoso, um elemento incendiário e transgressor.

No discorrer dos anos desta república das bananas, muitos foram os momentos autoritários, aliás, volta e meia vivemos um, onde os órgãos de educação responsáveis pela implementação de políticas que bombeiem para nossas veias a vontade de ler, que desperte a gula por livros, são sequestrados com o intuito de aviltar o hábito de ler.

Na década de trinta o governo de Getúlio Vargas promoveu a queima do livro Capitães da Areia de Jorge Amado em praça pública, nos anos sessenta O Casamento, de Nelson Rodrigues, foi censurado pelo regime, Feliz Ano Novo, de Rubem Fonseca, foi publicado em 1975 e recolhido pelo Departamento de Polícia Federal, entre outros. Hoje não vivemos sob um governo autoritário, a reflexão sugerida é, qual o impacto que uma cultura de medo estabelecida a partir da ideia de que um povo que lê com frequência pode afetar até administrações mais progressistas.

Talvez progressista não deva ser a palavra, atualmente, algumas expressões carregam uma carga semântica que não condiz com a verdade, simplesmente por ser contaminada pelo ambiente. Porém, fato é que as investidas para que tenhamos uma população que possa ser classificada como leitora está muito distante, as políticas públicas nesse sentido são sempre acanhadas e desinteressadas.

O leitor é alguém que se forma no processo, ninguém nasce ou não com aptidão para leitor, ou seja, forma-se a partir de exemplos, de influência, e desde pequenos. Ora, então, por que não se constrói esse ser já na tenra idade?

A literatura é uma manifestação poderosa da resiliência humana, uma ferramenta que transcende as barreiras do tempo e do espaço para capturar e expressar as complexidades da experiência humana. Um exemplo emblemático dessa capacidade da literatura de encarnar a resiliência é encontrado na literatura pós-guerra. Autores como Primo Levi, que sobreviveram aos horrores dos campos de concentração nazistas, que mantinham uma política de queima de livros, transformaram suas experiências traumáticas em obras de arte que não apenas testemunham a brutalidade da guerra, mas também celebram a força do espírito humano diante da adversidade.

Além disso, a literatura oferece uma plataforma para a expressão e a validação das vozes marginalizadas e silenciadas. Autores de comunidades oprimidas e historicamente marginalizadas encontram na literatura uma maneira de contar suas próprias histórias, de afirmar sua existência e de resistir à tentativa de apagamento cultural. Ao ler sobre as lutas de personagens fictícios ou reais, os leitores são convidados a se identificar com suas jornadas, a reconhecer sua própria resiliência e a encontrar inspiração para enfrentar seus próprios desafios. Ademais, a criação literária em si mesma é um ato de resiliência.

Portanto, a literatura é muito mais do que meras palavras impressas em uma página; é um testemunho da resiliência humana, uma celebração da capacidade do ser humano de encontrar significado e esperança mesmo nas circunstâncias mais difíceis. Ao ler e escrever, participamos de um ato contínuo de resistência contra as forças que buscam nos derrotar, encontrando inspiração na beleza e na força da narrativa humana, acho que isso explica muita coisa…

Link da foto em destaque: autoral

 

 

 

 

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Tito Dassil

Professor de Língua portuguesa e espanhol, pós graduado em Psicopedagogia e Literatura Brasileira, poeta e romancista. Autor do ebook A Sétima Carabina (contos e crônicas) pela Amazon.

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