Ellen Lessa

Caro Sr. Otimismo

Fonte: canva gratuito

 

Caro Sr. Otimismo,

Agradeço seu convite, porém hoje necessito me afastar de ti!

Andei sentindo uma ânsia de amor e morte dentro do meu ser, e não sei quanto tempo aguento. Tic-tac! Tic-tac!

Chorei o dia inteiro e adoraria acreditar que depois da tempestade vem o arco-íris. O senhor nos permite o voo e finge não ver a queda, não é Sr. Charla… Bom, quero dizer, otimismo! Não é, Sr. Otimismo? A realidade é simples e cruel, destroça todos os “faz de contas” que sonhávamos viver quando crescêssemos.

Humanos, mistura de raiva, sequelas… que viram malditas lembranças… E eu… ainda sei sonhar? Bom…Aqui, por outrora já foi tudo diferente, meu caro Otimista. Com sorte, quando criança era me permitido rodopiar pela sala de estar e ser uma bailarina! Ah, que tempo!… Hoje, bruta, adentrada nos resquícios fantasiosos da infância, com olhos e coração cansados da idade, ainda sim, recordo-me o que resta de minha velha felicidade. Ah, como chora minha criança ao vagar sobre quem sou hoje… Como proceder? Como acolher? Diga-me, Sr. Otimismo! Choro por ela, lamento que ainda sinta precisar ser como tocha, luz que ilumina todos e se perde em meio à esperança e otimismos. Derramo-me ao meu novo velho peito, este luar, quente, que só meu eu criança consegue adentrar com… afeto. Estou cansada de ser bailarina, Sr. otimismo! Você sabe, o que me resta é dançar com Ela, a linda melancolia, ao som do Cartola , este que é tão certeiro… Você, sim, você mesmo, tritura nossos desejos, sem remorso, fingindo ser alguma lição de vida, gargalho ao escrever isso…E há quem ouse dizer que é crescimento, que isso nos torna mais fortes. Ok, obrigada pela dica horrível! Obrigada viu, Sr. Coach! Quero dizer… Cretino! Não pera, ladrão de dinheiro! Agora vai… SR. OTIMISMO!

Tudo bem, tudo bem… Vamos lá!

Sou forte? Não, nem 1%, meu caro! Porém deixo a dúvida aos otimistas de plantão, se estar dessa forma é ser forte, o que é fraqueza? O que é errado, meu caro? Somos nós os pessimistas? Ou vocês os alucinados? Depois da tempestade vem o que mesmo? Sei que teus filhos guardam rancor, tapados com máscaras de felicidade, meu caro…

Ah, qual o sabor? Me diga, qual o sabor da realização? Qual o sabor de ser forte?

Acredite, sei que corres de mim e as respostas nem sequer trazem o ar da graça, estas que estão trancafiadas em tua garganta, um baú sonoro escondendo tua vivência falsa!

Mas te digo, alguns sonhos viram café, talvez por isso eu os ame tanto e o choro caia doce na boca. Aquele gosto quente e amargo na ponta da língua, ah… Por ora não sei definir se são os meus dias ou realmente o café… Gargalho e percebo que, talvez, eles o abominam porque salivam otimismo em demasia.

Sr. otimismo, odeio prolongar-me, porém… minha humilde opinião? Tu és o maior charlatanismo e, ainda sim, não largo tuas mãos… Hoje você vale ouro… Otimismo! Esperança! Uma caixa de pandora! Um toque muda, um toque é morte, mas como ia dizendo…

Já me despeço, meu tóxico amigo otimista, a dor rasga, e há outros como eu, já não sentem tanto, talvez um formigamento, um olho que não para de tremer… Vivemos. Vivemos nublados, sorrisos amarelados e cuspindo vozes em um tom sarcástico, mas vivemos.

O nosso depois da tempestade vem coberto de um céu cinza, e nunca fomos tão gratos pela sombra, o frescor que chega aos nossos corações, por não queimar-mos vivos com este maldito sol otimista.

Fique longe! Com rancor,

Ellen Lessa

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Ellen Lessa

Uma vez li uma frase da Clarice Lispector que me impactou: "Enquanto eu tiver perguntas e não houver respostas continuarei a escrever.". Como ser pensante me vejo escrevendo e poetisando até meu fim. Minha arte sempre estará viva, a poesia pulsa e carregarei com toda minha alegria essa dádiva. Então, muito prazer, sou Ellen, íntima, genuína e profunda. Bem vindos a uma parte de mim!

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