Fabio Rodrigo

Números

Às 6 horas, levanto da cama. Tomo um banho e me arrumo. Sorvo uma xícara de café. Saio de casa às 7 horas. São 20 quilômetros até o trabalho. No caminho, paro para abastecer o carro. 30 litros de gasolina. Continuo o percurso. No rádio, a previsão do tempo. Mínima de 16 e máxima de 32 graus. Notícias e mais notícias com número de assaltos, número de homicídios, número de infectados. Números, números, números.

Às 8 horas, chego ao trabalho. Subo o elevador e desço no 15º andar. Pego o corredor, e minha sala é a segunda à esquerda. Me deparo com planilhas, gráficos, indicadores financeiros. Números, números, números. Às 10 horas, engulo um comprimido de 500 mg. Tomo de 12 em 12 horas contra sinusite. Ligo para um cliente. Ofereço um plano promocional. Os números são atrativos. Fecho a venda.

Às 12 horas, saio para o almoço. Peso o meu prato: 432 gramas. Sento na mesa 11. Peço uma lata de refrigerante sem gelo. Termino de almoçar. Pago no débito. Digito a senha de 6 números. Volto para o trabalho no 15º andar. Às 14 horas, uma reunião a portas fechadas. Os números estão longe da meta. Números, números, números. Volto pra minha sala. Número de clientes, número de produtos, número de vendas. Números, números, números.

Às 17 horas, saio do trabalho. Pego meu exame de sangue no laboratório. Glicose (100 mg/dL). Colesterol total (200mg/dL). Passo no mercado e encho o carrinho de compras. Caixa 7 livre. Pago no crédito em 3 vezes sem juros. Digito a senha de 4 números. Saio do estacionamento. São 5 quilômetros de engarrafamento, deu no rádio agora.

Às 20 horas, chego em casa. Às 21 horas, eu janto. Às 22 horas, tomo o segundo comprimido de 500 mg. Vejo TV até às 23 horas, quando sai o resultado do sorteio federal. Os números caem de um em um. Pra minha decepção, os números sorteados não são os mesmos números que apostei. Aborrecido, vou pra cama dormir. Antes disso, ponho o relógio pra despertar às 6 horas. Afinal, no dia seguinte, será mais um dia com números, números, números.

 

Imagem interna e externa: https://pixabay.com/pt/illustrations/fundo-n%c3%bameros-contando-n%c3%bameros-5594879/

 

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Fabio Rodrigo

Fábio Rodrigo é professor de Língua Portuguesa da secretaria de educação do estado do Rio de Janeiro e é doutorando em Língua Portuguesa pela UFRJ. Recentemente adquiriu o título de mestre em Estudos Linguísticos pela UERJ/FFP. Tem se dedicado a escrever crônicas que abordam temas do cotidiano e sua relação com a língua portuguesa e que são publicadas semanalmente no jornal Daki e no portal Entre Poetas e Poesias. Seu primeiro livro, Mixórdia e outras histórias, lançado pela editora Apologia Brasil, é uma coletânea de crônicas publicadas tanto no Daki quanto no portal. Suas crônicas, em sua maioria, são ambientadas no município de São Gonçalo, cidade em que o escritor nasceu e em que trabalha como professor. Como professor de Língua Portuguesa, Fábio Rodrigo procura aproximar o conteúdo das aulas de Português ao dia a dia, e seus textos são o resultado disso.

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