Fabio Rodrigo

Meu amigo Benites

Eu estava no ônibus indo para casa. Sempre que volto de um dia de trabalho, tento esboçar um roteiro de uma história. Pra quem não sabe, utilizo desse tempo de viagem para pensar em algo pra escrever. Já estava com a narrativa quase pronta na minha cabeça. Tinha inclusive escolhido o personagem principal. Quando o descrevia mentalmente, eis que o ônibus para no ponto para pegar um passageiro. Pra minha surpresa, quem subiu no ônibus era exatamente o personagem que eu estava descrevendo. Como? Sinceramente não sei. O fato é que eu nunca havia visto este sujeito na minha vida.

Ele pagou a passagem e passou pela roleta. O ônibus estava vazio. Havia muitos bancos vagos para ele sentar.  No entanto, escolheu justamente o que eu estava. Sim. Eu estava no canto da janela, e ele sentou ao meu lado. Percebi que havia um odor de cigarro no ar. Certamente ele estava fumando antes de pegar o ônibus. Era fumante, mais uma coincidência com meu personagem. Era um senhor de aproximadamente 60 anos, cabelos grisalhos, barba por fazer e um farto bigode. Daqueles que inevitavelmente ficam com a marca da espuma quando damos um gole em uma cerveja com colarinho.

Não demorou muito, e ele puxou assunto comigo. Pela conversa dele, percebi que era policial aposentado. Outra coincidência. Conversamos sobre vários assuntos: desde política e futebol até problemas no nervo ciático. Chegamos à conclusão de que temos muita coisa em comum: time de futebol, posição política e uma fibromialgia.

Conversa vai, conversa vem, e era hora de eu descer do ônibus. Fiz questão de cumprimentá-lo: “Foi um prazer conhecê-lo, Benites!”. Não sei se era esse seu nome, mas chamei-o de Benites. Era o que havia pensado para o meu personagem. Ele, no entanto, não se importunou e me deu um forte aperto de mão.

Desci do ônibus com a sensação de que poderia ter ficado horas conversando com o Benites. Ou melhor, com meu amigo Benites. Parecia que já nos conhecíamos há muito tempo. E, além disso, não é qualquer hora que podemos encontrar com um de nossos personagens por aí.

Imagem interna e externa: https://pixabay.com/pt/photos/%c3%b4nibus-dentro-vazio-cidade-1263266/

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Fabio Rodrigo

Fábio Rodrigo é professor de Língua Portuguesa da secretaria de educação do estado do Rio de Janeiro e é doutorando em Língua Portuguesa pela UFRJ. Recentemente adquiriu o título de mestre em Estudos Linguísticos pela UERJ/FFP. Tem se dedicado a escrever crônicas que abordam temas do cotidiano e sua relação com a língua portuguesa e que são publicadas semanalmente no jornal Daki e no portal Entre Poetas e Poesias. Seu primeiro livro, Mixórdia e outras histórias, lançado pela editora Apologia Brasil, é uma coletânea de crônicas publicadas tanto no Daki quanto no portal. Suas crônicas, em sua maioria, são ambientadas no município de São Gonçalo, cidade em que o escritor nasceu e em que trabalha como professor. Como professor de Língua Portuguesa, Fábio Rodrigo procura aproximar o conteúdo das aulas de Português ao dia a dia, e seus textos são o resultado disso.

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