O poeta, a Incivilidade e a indiferença
Por diversas vezes fui assaltado, outras hostilizado, até agredido fui, a socos e pontapés, por aqueles que deveriam me proteger. O que mais violou minha alma não foi a violência física ou as hostilidades daqueles que ainda não foram humanizados, foi o fruto da incivilidade e da indiferença. Outro dia no mercado do Bairro saudei a todos em bom tom e não obtive nem um retorno verbal, nem um aceno amigo. Até brinquei com eles:
-A gente reclama da violência quando passa no jornal, mas não desejamos um bom dia ao nosso vizinho. Será que somos civilizados?
Segui minha caminhada e em outra situação, eu estava em uma confraternização e saudei uma dama e ela me golpeou com as garras da indiferença: Eu te conheço de onde?
Calmo como um poema de Tagore eu respondi:
-De lugar algum. É que onde eu moro as pessoas são tão civilizadas que saúdam até os pardais que vagam pelas ruas, quanto mais uma dama elegante como a senhorita.
Enfim, muitos momentos ilustram essa triste realidade…
Uma certa feita eu estava num restaurante com um amigo e chegou alguém que tinha o bolso obeso de cifras e uma posição social elevada e o amigo me ignorou. Não me olhava mais nos olhos, nossa conversa agradável perdeu a cor. Tudo que a visita falava ele concordava e a nossa noite feneceu numa barganha de bebidas por elogio exagerado.
E o casamento de dois grandes amigos que me vetaram? Os fantasmas de outrora vieram assolar minha nobreza… O prestigio que me negaram por eu ser um artista e não um doutor e, minhas telas que foram quebradas na exposição que fiz ao ar livre para toda cidade, para uma gente de paz e civilidade. Recolhi todo o lixo e transformei em arte e ofertei ao único lugar do mundo onde os museus não abrem aos sábados, domingos e feriados.
Por essas e por outras que não pude enumerar, fiquei com fobia social. Raramente vou a algum ajuntamento festivo, até na igreja sento no último banco. Sou um poeta, gosto da paz e o silêncio dos campos. Não troco a sinfonia dos pássaros por essa música de mau gosto que o povo canta com outras partes do corpo, que nem merecem ser mencionadas. Não troco uma tarde sobre a relva por uma conversa vazia, ainda que seja num castelo regado a um vinho bom. Sei que nesses bailes de feras, constantemente somos devorados por essas damas banguelas que se chamam incivilidade e indiferença. Meu antídoto é a poesia e ela é minha bússola cotidiana. Quando saio de casa sempre carrego no bojo da alma um pensamento de Gibran “conquistador é aquele que sabe amar”.
E sigo pelas ruas
Com a cabeça nas nuvens
Escalando estrelas
As pedras que me ofertam
Transformo em poesia
Na foz do meu silêncio
Nasce sempre um novo salmo
Meu coração é um menino
Só quer falar de amor.
(Esse texto é de Luciano dos Anjos, poeta, letrista, artista plástico, estudante de psicanálise e ativista cultural. Tem vários livretos publicados e dois livros: “Distravando”, 2013 e “Travas e Trovas”, 2018. Instagram: @seuludasartes)
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