Você, escritor! – Crônica: Não errei sozinha, por Flávia Joss
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Flávia Joss, professora, escritora e idealizadora de projetos culturais que promovem o encontro com a poesia e outras formas artísticas como o Chá Literário. @flaviasjoss_
Não errei sozinha
Dizer que Marina Colasanti é uma escritora sensacional não é uma novidade. Estou sempre com um texto dela por perto, um conto de fada, um miniconto, uma poesia… atualmente estou relendo Fragatas para Terras Distantes, livro de ensaios, sensacional! Gosto de me reencontrar com textos que li em algum momento. Voltar a eles sempre me proporciona um frescor. Sempre há coisas novas a desvendar que vão aprimorando ou modificando as leituras anteriores. É como estar diante do mar, por mais que você o conheça, a cada mergulho uma nova experiência nos toca.
Lendo o segundo ensaio do referido livro intitulado “Erros e acertos de uma mãe contaminada”, me identifiquei de imediato. Recostada sobre uns travesseiros, gargalhei, sozinha em meu quarto. “O que haveria de tão engraçado nas palavras da Marina?” Justamente o fato de eu ter cometido o mesmo erro que ela. Nesse capítulo ela narra uma situação pessoal sobre a formação do hábito de leitura de suas filhas.
Sou uma mãe leitora- professora-escritora, meus filhos cresceram rodeados por livros. Meu filho do meio, aos 8 anos leu Os três mosqueteiros e ao final da aventura literária me disse “Mãe, esse é o melhor livro que li na minha vida!”. Hoje, aos 17 anos, é um leitor voraz. Comprei uma versão infanto-juvenil de os sertões para o mais velho quando ele tinha 12 anos. Ficou encantado! Aos 16 quis ler o texto original, é certo que se assustou com a espessura do livro…, mas essa leitura o marcou. Os contos de fada embalavam a imaginação da caçula desde cedo, amava a Chapeuzinho Vermelho, eu a explicava que era um clássico. Aos 6, quando passou a dominar a leitura, mantinha seus encontros com a menina de gorro vermelho, Vovozinha e Lobo mau. Lembro-me de um dia dizer “Filha, leia outro livro!” e ela, cheia de si, me respondeu “Mãe, Chapeuzinho é um clássico, nunca fica velho.” Emudeci diante de tão grande sabedoria. No nosso mundo, ler era bem natural. Então, passei a presentear os amiguinhos dos meus filhos com livros. Hábito que perdurou até pouco tempo.
E assim como aconteceu com a escritora, também aconteceu comigo… Um dia, depois de chegar de uma festa de aniversário, minha caçula falou em tom de queixa “Minha amiga disse que eu só dou livro de presente…” Entendi que era um pedido para mudar os presentes. As meninas queriam ganhar brinquedos, sonhavam com Barbies, e eu, a todo custo queria levá-las para as páginas mágicas de um livro. Ri do nosso constrangimento, da nossa displicência e inocência.
Confesso que às vezes tenho umas recaídas, a tentação de presentear crianças e adolescentes com livro é grande. Mas procuro conter o impulso. Entro na loja de cosméticos e compro maquiagem. As meninas adoram e recebem o regalo com gratidão. Ofereço os livros aos amigos leitores que, como eu, se perdem nas garras de uma boa leitura.
Flávia Joss, junho 2020.