Uma história de Cambuci
Série: Histórias do Brasil (conto III)
Esta é a história da cidade onde o senhor Aílton Felício vive e participa ativamente das maiores expressões artísticas do lugar. Seu filho Jaílton, saudoso de Cambuci (interior do Rio de Janeiro), narrou com carinho os mitos da região que tanto ama. Lá, na cidade simpatia, conforme é chamada, por causa da maneira como acolhe os seus visitantes, o senhor Aílton compôs o hino do time de futebol Floresta, escreveu marchinhas de carnaval para os blocos locais, além de inúmeras outras atividades culturais. Portanto, seja lenda ou história real, tanto faz, o importante é a homenagem que este humilde escritor do Diário da Poesia faz à família Felício, em atenção especial à dona Mocinha (in memoriam), aquela que tanto lutou para criar seus filhos.
O índio da tribo coroado entrou correndo e puxou todos para fora da oca. Mostrou à sua família que aqueles homens brancos já aportavam do outro lado do rio. Sim, revelou-se preocupado, gente estranha se aproximando, seu senso guerreiro aguçara ainda mais desde a tarde do dia anterior. O nome desse nativo? Dizem que se chamava Cambuci e significava fruto em formato de cambuca (ou cumbuca), por causa de certa espécie de alimento tropical abundante em regiões do Brasil.
Cambuci liderou a transferência de toda a tribo para as bandas do interior do Estado do Rio de Janeiro. Lá nas Minas Gerais os bandeirantes devastavam tudo que viam pela frente. Uma covardia só. Munidos de mosquetões, facas, cães de caça e facões, portugueses de má fé invadiam, matavam, estupravam e tentavam escravizar os índios que encontravam em sua vidas pacatas. Na verdade, os europeus “tentavam” escravizar os nativos, mas não conseguiam, pois pouquíssimos eram aqueles coroados de pele vermelha que se entregavam aos colonizadores.
Esse líder indígena transferiu as pessoas da aldeia, juntou os guerreiros, investiram-se de coragem – e assim eles se embrenharam firmes na mata. Armaram-se de tacapes, lanças e flechas untadas com secreção de sapo venenoso. Constituíam arsenal letal estes armamentos confeccionadas pelas mãos dos próprios coroados, no entanto, desproporcionais se comparadas ao poder bélico dos “cara pálidas”.
Dessa forma se deu a primeira covardia da região cambuciense. Os coroados já deslocados de suas Minas Gerais foram depois perseguidos e assassinados nas bandas do Rio de Janeiro. Bravíssimos foram os nossos guerreiros indígenas que resistiram e infligiram baixas também para o lado dos primeiros bandeirantes. Demonstraram bravura, história digna dos melhores heróis de filmes e romances históricos.
E foi assim, era uma vez, de quando a nossa gente nativa deu a vida por esta terra, e o nome do guerreiro Cambuci logrou ao menos um lugar de batismo da própria cidade fluminense. Viva Cambuci, viva a sua História.
* Nota: Sabe-se que o apelido “coroados” se originara dos cortes cabelos raspados nas laterais, à maneira de coroas, valendo-se de moldes fabricados com as cambucas feitas com o fruto cambuci e tingidos com pigmento rubro de urucum e pasta extraída do sapotizeiro.