Natalina
(https://pixabay.com/pt/photos/rowan-galhos-inverno-neve-natureza-2098486/)
“Porque elas não o resguardaram para que pudesse pertencer a outros,
Nem o recolheram em troca de presentes ou recompensa.
Lavei minhas mãos de tudo isso; e gostaria de ter descoberto o meu caminho antes do meu cabelo ter ficado grisalho.” – Al-ma’arri.
A vida é um jogo estabelecido em desconexão com as regras da existência física. O corpo já nasce meio derrotado. É necessária a permissão para dormir. Na verdade, é uma honra ser pueril. Doente das coisas rasas, abutre da atmosfera alheia nos olha como meu pesadelo. Se eu fosse político, não descenderia nem das palavras incertas. Sentiria o valor extraordinário da revelação, dos trabalhos de previdência, da anarquia espiritual que refaz laços de convenção patriótica.
– Nobilíssimo soldado, o que faz quando se resolve pela alforria das palavras buscando uma unidade essencial da corporação?
– O destino de gente nobre constrói conceitos livres?
Papo vai, papo vem, desfile civil e sem graça. Um soldo a ridicularizar o alistamento voluntário. Sofremos maus-tratos. A fantasia é corriqueira e requisita a prática de cidadania?
Cidadania é coisa farta para as nobres famílias, acabam em separação oficial os patrícios de malfadado destino. Amesquinhou-se a ideia dos corpos livres, parecem-lhes sempre indecentes, imorais. O sentimento de razão, guia de alguma verdade, é cuspido na calçada das coisas rasas. Liberdade humana é coisa asséptica e assentada, na qual o sabor e o saber humano nos devoram. Repousemos. A consciência da inutilidade regressa à inegável invenção de um campo para dois.
Que homem seria capaz de tatear o paraíso dos justos? Pedir clemência repentina ao amor que lhe oferece um abraço inoportuno como a fumaça de um cigarro? Teclas bem rápidas constroem doses sutis de apreço e de desejo, para quem? Para qual momento? Em que campo o tal santo te abandonaria num encontro fortuito e clandestino?
Por todos os países se fixam bandeiras e as casas estão prontas para o tribunal. Deixarias para trás as câmeras civis e avançarias civilizadamente pelo templo que desejas? Iluminam-se os postes das cidades centrais e suburbanas e a preocupação é sempre a mesma: a provação pelos jardins das palavras incertas. Muros pavimentados nos colocam a turba lama, parece que sempre nos escolhem funcionários da Instituição do Mundo e, ao que tudo indica, não há como fugir. Velha tradição. Você espera a baforada de um esconderijo pleno, seguro, o vácuo dos ruídos que escutam, quando, na verdade, não passavam nem os próprios passos.
De que adiantam lembranças da mesma ordem? Queremos sempre o antigamente no futuro que sempre chega, mas pelo arrastão da boa e velha história. Dos dias, pensei em levantes e trovões marcados por esperanças fugidias, data marcada, desbravamento e muita festa clandestina.
Os mortos vivem pela manhã e sem esperanças, consideração moral e respeitosa pelo dardo do passado. O dia fechou e as águas que fogem cessam. Dizem adeus e afundam as clássicas preces de amor em trevas. Então a poesia é isso? Coisa que morre de amor sem ser feita, vida que bate insuspeita, febre milenar e juvenil? Foi o que me disseram… mas, para mim, não passa de paciência grisalha e sem amplidão. Você fica parado, parado, parado, parado… a explosão de relâmpagos parece ser o festim tão desejado e se morre pela vida mesma e pesada. Parece coisa de bom filho, que vem contente e se contenta com a estrela brilhante. Daquele cansado soluço, com a face na mão, suspira tedioso sem saborear o suor do físico querido. Os lábios roçados da vida ficam por conta da terra, do enterro, da história tardia que nos há de matar.