Em um vilarejo no século XVI, vivia um casal com quatro filhos: três meninos e uma menina. Ela não se conformava com o fato de todas as tardes seu pai saía com os dois mais velhos. A mãe ficava cuidando do filho caçula. A pequena, então com 10 anos, já tinha obrigação dos afazeres domésticos.
Sempre observava atentamente cada livro que seu pai escolhia, não sabia ler, porém reconhecia que eram diferentes na espessura. Isso aumentava ainda mais sua curiosidade e questionamento: “eles podem, eu não?”. Por quê?
Decidiu mudar os trajes, prendeu os cabelos e saiu vestida de menino para seguir os estudantes. Não era uma sala encantada… era um local com pedras retangulares onde todos sentavam e ouviam o orador. Havia mais homens no lugar, somente homens! Todos atentos à aula, não perceberam a chegada de um “novato”, mas o professor sim. Como não reconhecer a própria filha?! Ainda que mal disfarçada!
Ao término da aula o professor se dirigiu a ela e disse baixinho:
– Não vá embora novo aluno, preciso passar algumas informações.
Ela estava com medo, não menos curiosa. Aguardou e olhava atentamente as poucas ilustrações do estabelecimento. Quando ficaram sozinhos ele falou:
– Não foi correto sair escondida, mocinha! Desobedecendo aos seus pais! Aqui não é lugar para meninas!
– Papai, por favor, não brigue! Eu quero aprender a ler e escrever como vocês…- respondeu com a voz de choro- Não contarei a ninguém, pai.
– Não posso fazer isso! Se a Corte souber, serei enforcado! – falou irritado ao pé do ouvido da pequenina-
Saíram os quatro em direção a casa. Os meninos estranharam a outra companhia, mas nada falaram em respeito ao pai que estava muito sério e pensativo.
Em casa o silêncio era absurdo. A menina foi deitar chorando e com muitos soluços adormeceu. Na semana seguinte, durante o café, o pai colocou a família sob juramento: nenhum deles poderia comentar o ocorrido e a partir daquela data ensinaria a filha ler e escrever também! Isolada dos meninos ,sozinha dentro de casa. Terminou o discurso com a frase:
– Essa é a maior riqueza que posso deixar para vocês!
Ivone Rosa
