João Rodrigues

Bons tempos, aqueles!

Sempre gostei muito de viajar. Não podia aparecer um feriadão que lá estava eu na estrada, com as janelas abertas, sentindo o vento bater no meu rosto, um olho na estrada e o outro na paisagem. Minha esposa dizia que eu ia acabar ficando vesgo. Eu nem ligava. Caso eu ficasse vesgo, enxergaria com os olhos da alma.

E lá íamos nós, com destino a mais um pedaço do Paraíso. Aqui no Ceará há lugares que se Deus tiver feito algum mais bonito ficou com ele lá por cima. Temos de tudo: falésias, montanhas, praias lindíssimas de encantar até quem já mora lá há vários anos. Imagine o turista. Fica doido!

Sempre que conheço um lugar novo, digo: “Daqui a uns dias volto aqui”. Mas lá se vem outro lugar mais bonito, e outro mais bonito, e outro ainda mais bonito, e nunca que retorno. Mas há uma praia à qual sempre volto: Canoa Quebrada. Já estive lá quase dez vezes, e confesso que estou com vontade de ir de novo.

Quando pego aquela estrada em direção a Aracati, minha alma só falta sair do meu corpo. A paisagem é maravilhosa. E o melhor: vou parando aqui e acolá, conhecendo cada lugar pelo caminho: engenhos, museus, casarões antigos, vendinhas, pracinhas, e o que mais tiver de interessante.

As praias são meu destino preferido. Depois delas, as serras e qualquer outro lugar turístico. O que importa mesmo é sair de casa e conhecer um lugar novo. Apesar de Canoa Quebrada ser meu destino preferido, gosto de conhecer outras praias, outros recantos. Por aqui é só o que tem: Jeri, Canoa, Lagoinha, Lagoa do Timbau, Morro Branco, Ponta Grossa, Cumbuco… é uma imensidão de lugares lindos!

Mas o tempo foi passando e as condições foram mudando. Não as condições climáticas, mas aquelas que deixam todo turista fazendo contas e cortes. A inflação engolindo tudo, a gasolina indo às alturas e a gente dando, no máximo, um rolezinho na praça da matriz.

O Natal está chegando. As férias também. A vontade de viajar mexe com a gente, cutuca, implora. Aí lá vou eu refazer as contas. Corta daqui, recorta de lá… e pra acabar de completar um amigo liga:

– E aí, vamos passar o natal em Guaramiranga? Lá não tem praia, é serra, mas é daqueles lugares que você chora quando tem que voltar pra casa.

– É uma boa pedida. Já ouvi falar – respondi.

O colega falou das maravilhas desse lugar e me mandou pesquisar na internet, caso eu quisesse ver fotos, o preço das pousadas, as atrações, a paisagem… e me indicou um ótimo site de turismo. Foi o que fiz. O lugar é um paraíso, mas os preços estavam mais para, no mínimo, o purgatório.

Logo liguei de volta pro meu amigo:

– E aí? – respondeu ele do outro lado, empolgadíssimo. – Conferiu? Gostou?

– Adorei tudo. Mas estou te ligando pra que você me indique um ótimo site de anúncios.

– O que houve? – quis saber o amigo, sem entender nada.

– Quero colocar o meu carro à venda. A gasolina subiu de novo. E com o preço do jeito que está, não consigo chegar nem à metade do caminho.

A ligação caiu. Tentei ligar outra vez. E me veio aquela mensagenzinha irritante:

“Seu saldo é insuficiente para completar a sua ligação!”

Bons tempos, aqueles!

 

Foto: Arquivo do autor

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João Rodrigues

Nascido em Riacho das Flores, Reriutaba-Ceará, João Rodrigues é graduado em Letras e pós-graduado em Língua Portuguesa pela Universidade Estácio de Sá – RJ, professor, revisor, cordelista, poeta e membro da Academia Ipuense de Letras, Ciências e Artes e da Academia Virtual de Letras António Aleixo. Escreve cordéis sobre super-heróis para o Núcleo de Pesquisa em Quadrinhos (NuPeQ) na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.

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