Cristiano Fretta

Eu quero viajar para o espaço

Toda criança já sonhou em ser astronauta. Eu, por exemplo, quando criança adorava brincar com foguetes de plástico. Quando adultos, no entanto, esquecemos desse desejo, soterrados que ficamos pelas coisas desse planeta. Não há espaço para colocarmos nossas roupas e fantasiarmos que ao invés de correr pelas avenidas estamos percorrendo nebulosas a milhares de anos-luz do nosso quarto.

Eu, no entanto, continuo com o mesmo sonho de viajar pelo universo. Ainda quero sorrir para os fotógrafos antes de subir na plataforma de lançamento, vestir a roupa branca muito pesada, atrapalhando meus passos, ter a existência suspensa pela ansiedade da contagem regressiva e, por fim, sentir o enorme incômodo da Força G me puxando para baixo enquanto uma quantidade absurda de fumaça e fogo impulsiona meu foguete para fora da Terra. Eu fecho os olhos em um autêntico medo, tudo é balançar e barulho, qualquer erro e eu explodo, desapareço para sempre.

Após alguns instantes sinto uma tontura muito forte, sinto leveza, sinto silêncio. Abro os olhos e tudo é preto por fora da cápsula. Lindamente eu começo a flutuar, como se executasse um número de ballet delicado e perfeito.

Eu viajo muito rápido, para além da velocidade da luz, em instantes observo estrelas distantes, chego muito perto daqueles pontinhos brancos que desde criança eu via no céu. As estrelas são imensas. Os planetas são infinitos, de texturas, tamanhos e cores muito diferentes. O que será que existe na superfície de cada um deles? Tomo cuidado para não ser sugado por nenhum buraco negro, saio da Via Láctea, eu estou muito longe agora, flutuando no vazio do espaço-tempo, esse tecido que é tudo e nada ao mesmo tempo. Seria necessária uma vida inteira para poder visitar cada estrela, cada planeta, ou melhor, seriam necessários bilhões de anos – e eu não tenho esse tempo todo.

Vagueio por umas nebulosas e quase consigo sentir o cheiro de queimado que invade minha cápsula por fora. Estou em um lugar a que o ser humano nunca chegou e talvez nem chegará novamente. Tenho a impressão de que por fora da nave faz um calor muito forte, um calor igual àquele que fazia nas noites de minha infância, enquanto eu brincava na frente da casa da minha vó.

Eu entro em um conglomerado de estrelas, vejo um planeta, me aproximo dele. Resolvo explorar sua superfície rochosa e fria, não há atmosfera, apenas um silêncio e uma solidão indescritível que se faz presente conforme eu me aproximo de sua superfície. Então, próximo a uma rocha, sentado, de tênis, regata e bermudas, eu vejo um menino brincando de foguete. Sei, a partir desse instante, que eu não conseguirei mais voltar para a Terra.

 

Fonte da imagem: https://pixabay.com/pt/illustrations/eclipse-sol-espa%c3%a7o-lua-planeta-1492818/

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Cristiano Fretta

Cristiano Fretta é mestre em Letras pela UFRGS, músico, compositor e professor de Literatura e Língua Portuguesa em escolas privadas de Porto Alegre. É autor das obras "Chão de Areia", "Tortos Caminhos", "A luz que entrava pela janela" e "Crônica de um mundo ausente". Também colabora com as revistas digitais Parêntese, do grupo Matinal Jornalismo, Passa Palavra e com o jornal Extra Classe. Nasceu e mora em Porto Alegre

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