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Série: Quarenta, é sério? – Cap.#03 – Crônica: “A incapacidade” – Renato Cardoso

Série publicada quinzenalmente às sextas na Revista Entre Poetas & Poesias - Instagram: @professorrenatocardoso / @literaweb / @devaneiosdumpoeta / @revistaentrepoetas

Série: Quarenta, é sério? – Cap.#03 – Crônica: “A incapacidade” – Renato Cardoso

A manhã de terça chegou. Os plantonistas estavam fazendo a troca de turno. A enfermeira Ana, que foi extremamente atenciosa comigo durante a madruga, veio se despedir. Tratou logo de levantar meu ânimo, dizendo que não me encontraria no próximo plantão dela, pois já estaria em casa com a família.

Trouxe-me o café da manhã, conversou um pouco. Ana tinha uma voz serena, passava paz. Disse-me que havia solicitado a equipe médica um remédio para que pudesse dormir a noite. Agradeci de coração. Desejei-a bom descanso e que Deus a pudesse recompensar por tudo que me fizera.

Já estava mais calmo. A pressão finalmente havia baixado. A saturação estava se estabilizando, mas a oxigenação ainda estava alta. A minha enfermaria ficava ao lado da UTI. Tinha medo de ir parar lá. Tinha dúvidas e queria saná-las, coisa de professor, sempre questionador.

A equipe que ficaria conosco já havia se apresentado. Uma enfermeira e uma técnica, ambas bem novas, mas atenciosas e competentes. Um nutricionista veio falar comigo, me perguntando o que gostaria de comer nas refeições. Fiquei surpreso com o atendimento. Eu estava em um hospital municipal, mas parecia particular.

Sempre fui muito observador, desde criança. Minha cama ficava de frente para porta do quarto, justamente onde a equipe de enfermagem ficava. Era por volta de 7 horas da manhã, quando trouxeram um rapaz, mais jovem que eu. Aparentava ter por volta dos seus 30 anos, de nome Edmílson.

Sujeito simpático e conversador. Já estava no hospital há 5 dias e tudo indicava que aquele seria seu último dia lá, pois teria alta. Trouxeram-no para ficar comigo, para que pudéssemos conversar. E assim o fizemos. Ele se apresentou. Contou-me tudo que acontecera com ele até então.

Era casado e tinha uma jovem esposa a sua espera. Trabalhava na construção civil. Aparentava ter uma vida bem humilde. Sabia conversar bem. Não demoramos a criar uma certa amizade. Em seguida falei um pouco sobre mim, e comecei a tirar algumas dúvidas com ele quanto a internação.

Por volta das 9 horas, a técnica de enfermagem responsável por nós chegou junto ao fisioterapeuta. Um profissional carismático, que tratou logo de nos levantar a moral. Estava perto do horário do banho e ele estava ali para ver se tínhamos condições de tomar banho sozinhos ou se teria que ser no leito.

Primeiro, o fisioterapeuta viu Edmilson. Percebeu que estava bem e que estava apto para tomar seu banho e ter alta. E assim foi feito. Em seguida, ele veio falar comigo. Apresentou-se, me fez algumas perguntas e me pediu para ficar de pé. Comuniquei-o que estava sem dormir direito há dias.

Levantei e, como já esperado, tonteei. Minha saturação desceu para 89. Fiquei nervoso, estava preocupado e com um baita medo. Ele me pediu para sentar na cama novamente, me explicou que não teria como eu tomar meu banho no chuveiro naquela amanhã, pois correria o risco de cair.

Tentei novamente, mas não consegui. Ali pude perceber que não conseguiria fazer algo que fazemos diariamente sem nos dar conta. Sentei-me na cama. O fisioterapeuta viu meu semblante preocupado e me prometeu voltar à tarde.

A técnica de enfermagem veio com um biombo, bacia e toalha. Olhei aquilo com um ar de constrangimento. Ela percebeu e procurou me dar a maior liberdade possível. Não podia levantar, tive que me banhar deitado mesmo. Foi a pior sensação que pudera sentir até então. A incapacidade de fazer uma coisa simples mexeu comigo.

Terminei o banho, me vesti, ela levou o material. Nisso, Edmilson retornou e me viu preocupado. Ele procurou me acalmar, dizendo que tinha acontecido com ele também, que era normal no primeiro dia.

Mas me conhecendo bem aquilo mexeu comigo e não deixar aquilo acontecer na manhã seguinte seria a minha grande meta, só não sabia como fazer. A profissional disse que o fisioterapeuta voltaria mais tarde e que me ensinaria algumas coisas. Esperei…

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Renato Cardoso

Renato Cardoso é casado com Daniele Dantas Cardoso. Pai de duas lindas meninas, Helena Dantas Cardoso e Ana Dantas Cardoso. Começou a escrever em 2004, quando mostrou seus textos no antigo Orkut. Em 2008, lançou o primeiro volume de “Devaneios d’um Poeta” e em 2022, o volume II com o subtítulo "O Rosto do Poeta". Graduado em Letras pela UERJ FFP e graduando em História pela Uninter. Atua como professor desde 2006 na rede privada. Leciona Língua Inglesa, Literatura, Produção Textual e História em diversas escolas particulares e em diversos segmentos no município de São Gonçalo. Coordenou, de 2009 a 2019, o projeto cultural Diário da Poesia, no qual também foi idealizador. Editorou o Jornal Diário da Poesia de 2015 a 2019 e o Portal Diário da Poesia em 2019. É autor e editor de diversos livros de poesias e crônicas, tendo participado de diversas antologias. Apresenta saraus itinerantes em escolas das redes pública e privada, assim como em universidades e centros culturais. Produziu e apresentou o programa “Arte, Cultura & Outras Coisas” na Rádio Aliança 98,7FM entre 2018 e 2020. Hoje editora a Revista Entre Poetas & Poesias e o Suplemento Araçá.

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