Série: Diário de um espectro chamado mãe – Texto: Os pés pelas mãos – Parte I
Há quem diga que o autismo não permite toques! E por experiência vos digo que existe um fundo de verdade, porém, esse toque acontece sim! De forma peculiar, confesso. Mas acontece.
Afinal o que seria a tal da hipersensibilidade de sentidos que a maioria tem. Veja; HIPERSENSIBILIDADE DE SEN.TI.DOS. Ou seja, sentem tudo em forma de “metaforas”, como diria a literatura, embora não as compreendam. Ou “exagerado” como diria Cazuza.
Controverso?! Com certeza!
Sem mais enrolação, vamos direto ao “causo”.
Embora eu já tivesse percebido certo apreço por “PÉS” por parte do meu filho mais velho, ainda não tinha visto uma demonstração mais profunda.
No dia em questão eu resolvi fazer um spa dos pés! Coisa rara de acontecer na rotina de qualquer mãe, imagina atípica! Mas havia conseguido!
Cheguei em casa com os pés bem lisinhos e unha feita! Eu mesma ficava olhando para baixo e os admirando.
Sentada no sofá, o Caio percebeu algo diferente. Olho, quis pegar e por fim já estávamos deitados um com o pé para o outro e ele entrelaçando seus dedinhos nos meus “dedões”.
Dali por diante percebi a intensidade de seu querer por tal parte do corpo! E eu?! Perdi meus pés para suas mãos! Foi o início de um relacionamento viciante.
Trocou a canção de ninar pelo afago nos meus pés! Dedos entre dedos e até cafungadas de vez em quando! Os pés pelas mãos em seu rosto agarrado; e foi assim que passou a dormir.
Por fim, o que parece peculiar para “normalidade”, para mim se tornou um dos poucos carinhos que duravam mais que os cinco segundos de abraço empurrado que por vezes eu forçava.
Na ocasião, eu ainda não havia sido chamada de “mae”! Então esse era, para mim, um dizer silencioso, através de um toque que supostamente não era possível e que me soprava: “Mamãe, eu te amo!”
Josileine Pessoa Ferreira Gonçalves
Imagens do texto: Arquivo da autora
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