Ponto Cem Réis ou bairro Santana?
Série: Histórias de Arariboia
Não vou negar que considero o Ponto Cem Réis um dos lugares mais memorialísticos de Niterói. Casarios que contam histórias da cidade no tempo do bode, as ruínas das fábricas a marcarem a paisagem, a igreja de Nossa Senhora de Santana, o Clube Marajoara, enfim, tudo isso daria um quadro de óleo em tela a estampar a mistura exótica entre o antigo e o novo.
Talvez o leitor não se dê conta do verdadeiro registro do território sobre o qual estamos falando. Isso mesmo, o lugar de que tratamos hoje não é o Fonseca, tampouco nos referimos ao conhecidíssimo Barreto, o assunto do momento é o bairro Santana. Não conhece? Jamais ouviu dizer? Então, vamos lá, surpreenda-se, o espaço em questão constitui há muito o que popularmente se convencionou chamar de Ponto Cem Réis. Os livros de história estão repletos de explicações sobre o ponto de parada do bonde, onde se mudava o valor da tarifa de viagem de 50 réis para 100, ou algo parecido. Sim, simples assim, percurso férreo estendido, pagava-se bilhete mais caro. Prontinho, eis o apelido do lugar.
A história em questão começa ainda no século XIX, com a prosperidade da antiga fazenda de Sant’Anna, adquirida pelo Brigadeiro tornado General, o senhor João Nepomuceno Castrioto. Isso aí, aquele mesmo que estampa até hoje o frontispício do quartel do Sétimo Batalhão de Polícia Militar (7º BPM – RJ), batizado em sua honra e glória, a margear a Avenida Feliciano Sodré. Exato, ao cidadão observador, não falta a curiosidade, está lá: Caserna Gal. Castrioto, esquina com a Barão do Amazonas, ao lado da Rodoviária de Niterói. Mas voltemos ao bairro Santana, topônimo surgido das terras da fazenda de mesmo nome.
De acordo com o site da prefeitura: “Santana é um dos bairros mais antigos de Niterói, limitando-se com São Lourenço, Fonseca, Engenhoca, Barreto, Ilha da Conceição e Ponta D’Areia, além das águas da Baía de Guanabara. Inicialmente suas terras foram ocupadas por plantações, mas a proximidade do mar foi fator fundamental para entender fatos que marcaram a história do bairro”.
Viu aí, que privilégio territorial? Uma pérola entre as fazendas fluminenses. Produção agrícola conjugada à atividade pesqueira de que se serviam seus vizinhos também. Logicamente, como resultado houve prosperidade a perder de vistas. Extração mineral, áreas destinadas a armazéns, tudo isso insuflou o fluxo de comerciantes. E assim se deu o desenvolvimento urbano. Portos de abastecimento, Igreja de Santana e seu largo crescendo em importância, valorização imobiliária pelas redondezas.
Já no século XX, com o progresso do vizinho Fonseca e a importância de São Lourenço, a locomoção férrea chegou em boa hora. As charretes que ligavam Niterói a São Gonçalo perderam espaço para os bondes puxados a burro. Posteriormente, esses mesmos veículos deram lugar aos bondes de tração elétrica e a outros veículos motorizados que nós conhecemos bem. A Rua Benjamin Constant deixou de ser a via principal. A Alameda São Boaventura intensificou o tráfego. A Ponte Presidente Costa e Silva (Rio-Niterói) alavancou o movimento, apelidaram a Avenida do Contorno de “transtorno”. Pronto, estava selado o apagamento gradativo do nome Santana.
Em suma, uma pena a narrativa terminar assim. Tempos de melancolia. Desgosta-me lançar mão da atual confusão das geografias. Pois é, falamos do bairro Santana, esse sim tem história.
Referências:
http://www.culturaniteroi.com.br/blog/?id=319
SILVA, Robson Rodrigues. Entre a caserna e a rua: o dilema do “pato”. Uma análise antropológica da instituição policial militar a partir da Academia de Polícia Militar D. João VI – sta.sites.uff. br (2011).