Colei da FFP-UERJ

Linha B36

 

 

Te vejo passar com as suas meias engraçadas, e o seu bando de amigas que se portam igualzinho a você. Sorrio de longe, porque você não consegue me ver. Continuo no mesmo ponto de ônibus de sempre, e encaro minhas próprias meias três quartos, enquanto espero um ônibus que não vai passar tão cedo. O tempo está calmo, não tenho certeza de que estação estamos, mas a brisa calma se faz presente, assim como o sol fraco do final da tarde, banhando as árvores e suas folhas verdes de vida.

Continuo vendo você passar, agora longe de mim, e olho até você virar a esquina, lançando um único olhar na minha direção, o único que você foi capaz de me dar durante esse tempo todo, ou até mesmo durante esse mês todos, cheio de incertezas. Eu entendo.

Eu também tinha algumas.

Talvez até mais do que você, mas eu não gostaria de falar sobre isso. Eu sabia que o único motivo de você não estar me fazendo companhia nesse ponto de ônibus vazio era porque eu quis assim, e que a culpa minha. E também sabia que você não me culpava.

“Ninguém pode culpar o coração, muito menos controlar o que sente.”

Foi isso que você me disse.

E eu entendia isso, de verdade. E até concordava.

Mas não conseguia deixar de me culpar, não por sentir, mas por ter me deixado sentir. Eu sabia que os seus sorrisos direcionados a mim, eram apenas amigáveis, e que as tardes que passamos nesse mesmo ponto foram apenas porque nós (bem, eu) não tínhamos escolhas a não ser esperar ou andar longos 30 min a pé até casa sozinhos, e ninguém quer isso.

Eu sabia que tudo o que você estava fazendo era porque se importava comigo, porque gostava de mim e não me queria sozinha. Mas eu quis e teimei ver esses gestos por olhos que não eram os seus, e sim os de alguém que queria mais que a sua amizade poderia me oferecer.

Por isso, pedi um tempo. Só pra poder botar a cabeça no lugar, esquecer o sentimento que, mesmo que sem querer, eu deixei nascer aos pouquinhos no meu peito.

E agora, ao invés de fazermos um par estranho sentadas no banco amarelo desse ponto levemente desconfortável e impessoal, dividindo o fone de ouvido, e, ao mesmo tempo, dividindo todos os pensamentos, mesmo que eles não fizessem sentido, tudo que eu faço é te ver passar.

E não posso mais te levar pra casa.

Espero achar o caminho da minha casa também, e sozinha.

–  Para a linha B36, e suas histórias de (desa)amor(es).

 

 

Alison Aguiar de Amorim, graduande em Pedagogia pela Faculdade de Formação de Professores da UERJ, Ex-bolsista do grupo de pesquisa Tri-Vértice e Bolsista Voluntário do Colei. Áreas de interesse: Educação Infantil e infância, educação sexual e literatura.

(O desenho que acompanha a publicação é de autoria de Alison Aguiar Amorim)

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