Série: Aproveite, quanto é tempo! – Cap.#01: “Só mais cinco minutos” – Renato Cardoso

Este capítulo deveria ser o último e não o primeiro deste livro, que se destina a contar várias histórias que tive com minha avó paterna. A obra será ilustrativa, cada capítulo terá uma foto (ou tentarei colocar uma foto por capítulo).

Era novembro de 2020, mais precisamente dia 27 de novembro, dia do aniversário da minha filha mais velha, Helena (a menininha da direita), que completara 8 anos. Como de costume, depois que minha avó passou a não sair mais de casa, nós levávamos as crianças sempre lá. 2020 foi um ano diferente, o mundo foi assolado por uma pandemia global. Não tínhamos como frequentar a casa dela como de costume.

Íamos, rapidamente, nos aniversários e nas datas comemorativas, como dia das mães. Só que este dia era diferente e seria muito diferente, foi o último dia que a veríamos pessoalmente (nota: escrever este livro é muito complicado para mim, mas preciso prestar esta homenagem).

Chegamos após o almoço. Ela estava sentada em sua poltrona na sala, estava dormindo. As crianças entraram em silêncio e foram direto falar com meus pais, que moravam com ela. Eu parei em frente a poltrona e a chamei duas vezes. Na segunda vez, ela abriu os olhos e demorou alguns segundos para me reconhecer. Assim que reconheceu, abriu um sorriso e me chamou pelo nome.

Sentei-me ao lado dela e começamos a conversar. Ela sempre ficava preocupada com a nossa alimentação, sempre perguntava: “Já comeu, meu filho?”. As crianças vieram abraçá-la. Helena, por ser a mais velha, teve mais contato com ela. Já Ana, nasceu num período onde a saúde dela já estava mais complicada.

Ela sorriu para as meninas e as chamou de bonequinhas (como sempre fazia). Minhas filhas foram brincar e eu fiquei sozinho com ela assistindo televisão. Entre uma dormida e outra, eu tentava estimular a memória dela, mostrando-a vídeos de programas que víamos juntos quando eu era criança e adolescente.

A cada vídeo mostrado, um sorriso era dado e um comentário era feito. Silvio Santos, Chacrinha, Gugu, Jô Soares eram os nomes debatidos. Relembrava o passado como ninguém (às vezes a memória confundia as coisas, mas o problema era a memória recente).

Esse momento durou cerca de 30 minutos. Não queria demorar por causa da pandemia. Não sabia que seriam os últimos trinta minutos, os últimos minutos que veria a pessoa que modificou a minha vida, que me proporcionou boa parte do que sou hoje.

A minha relação com ela era muito mais que avó e neto, era quase de filho e mãe. Entregamos a lembrancinha do aniversário e, como sempre, tiramos uma foto. A última foto. E como fiquei feliz que na última foto estavam as minhas filhas (elas tiveram a oportunidade de conviver com ela o máximo que puderam).

Foto tirada, nos despedimos. Dei um beijo na cabecinha branca dela, que me pediu que voltasse logo. Prometi voltar no final de semana, mas não foi possível. O Uber chegou e fomos. Ela já estava com 92 anos e com alguns problemas de saúde, mas resistia, sempre foi forte.

Hoje, quando vejo esta foto sempre me pergunto: “Se eu tivesse mais cinco minutos?”. Como gostaria de ter mais cinco minutos, só para falar da saudade que sinto. Só para fala da falta que ela me faz e como faz… A saudade pode ser um sentimento triste, quando a consciência pesa, mas no nosso caso não.

Graças a Deus, eu tive a oportunidade, ainda em vida, de dizer a ela o quão importante ela foi. A saudade, neste caso, é querer reviver momentos que espero que a minha memória nunca apague. Só queria mais cinco minutos para pedir conselhos, contar as vitórias, coisas que sempre fiz.

Um mês depois desta foto, ela faleceria devido a problemas nos rins e a Covid-19, mas o amor, a saudade, as lembranças ficaram e ficaram para serem eternizadas nesta obra. Vamos aos outros capítulos…

Link da imagem destacada: https://pixabay.com/pt/photos/escada-al%c3%a9m-nuvens-para%c3%adso-2748333/