Série – Curiosidades Literárias – Cap.#08 – Crônica: “Drummond e a ABL – uma cadeira não preenchida” – Renato Cardoso

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Série – Curiosidades Literárias – Cap.#08 – Crônica: “Drummond e a ABL – uma cadeira não preenchida” – Renato Cardoso

Uma vez eu fui a um estúdio de podcast dar uma entrevista. Isso mesmo, entrevista. Primeiro pensei o motivo pelo qual eu seria convidado a falar sobre algo. Qual relevância a minha fala teria? Aceitei, era um projeto de amigos. Eles haviam preparado um estúdio muito bom e a aparelhagem então…

No dia marcado, cheguei ao estúdio, que ficava na casa dos donos do projeto. Os anfitriões me trataram hiper bem. Senti-me em casa. Sentei-me e começamos a conversar (nada oficial ainda). As regras me foram explicadas e gravando…

Mas por que cito a entrevista? Devido a apresentação que fizeram de mim. O simpático entrevistador, ao abrir o programa, disse: “Ele que é professor, pai, esposo, poeta, escritor, editor, entre outros…” Num rápido lampejo, pensei: “Como assim?”.

Sem fazer desfeita ou fingir uma falsa humildade, disse que realmente era pai, esposo e professor, pois tenho esposa e filhas e sou formado em Letras, agora as demais rotulações disse não as ter. Escritor, poeta, entre outros, na minha cabeça, sempre ficou por conta do leitor.

Em período de autotitulações, o leitor perdeu seu direito de nomear seus escritores, pois o rótulo já vem junto ao livro. Agora imagina leitor, você compra um livro e não tem o direito de considerar quem o escreveu como escritor ou não? O que diriam os modernistas sobre? E os parnasianos e simbolistas cheio de suas regras?

Aí lembrei de um texto que li, onde o autor contava a história do motivo pelo qual Carlos Drummond de Andrade nunca ter entrado na Academia Brasileira de Letras. Se Drummond, que com suas pedras no caminho chocou o meio literário, ficou de fora, o que querem os demais?!

Drummond foi um dos maiores poetas brasileiros. Era modernista da segunda geração, mas não se considerava como tal. Mineiro de nascença e dono de uma poesia que girava em torno do questionamento existencial, era também conhecido com o poeta de sete faces. Mas o que levou Drummond a rejeitar a ideia de entrar para ABL?

Todas as academias, ou, pelo menos, a maioria, quando vão escolher novos acadêmicos abrem inscrições, ou seja, o escritor precisa se inscrever para tal vaga. Na época de Drummond, o postulante tinha que fazer uma vista a cada membro da academia, ou seja, o escritor tinha que “mendigar” aprovações para que pudessem se tornar um “imortal”.

Carlos Drummond de Andrade não quis simplesmente se submeter a tal processo. E não estaria ele correto? Ele optou por ficar de fora do Petit Trianon – prédio cedido pelos franceses para sediar a academia. A construção foi feita para comemoração dos 100 anos da Independência, em 1922.

Tentaram fazer com que o processo para Drummond fosse diferente, que ele não precisasse visitar os acadêmicos, mesmo assim o poeta recusou. Inclusive Pedro Navas, no alto dos seus 80 anos, quando tentaram fazer o mesmo com ele, disse: “Na minha idade, o sujeito já é uma vaga…”

Fica aí uma reflexão. Será que, em meio a tantas academias (virtuais e presenciais), o escritor de fato e de direito precisa se candidatar?! E caso os merecedores não se candidatem, o que nos sobra?! Pensemos… Drummond não tinha currículo suficiente para tal cadeira?!

Nessas conjecturas todas quem mais perdeu foi a ABL, que não pode ter o orgulho de ter um acadêmico como Carlos Drummond de Andrade. Para o currículo do poeta modernista, a ausência na casa dos imortais parece não ter feito tanta diferença.

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