Bondade como forma de abuso
Amor por obrigação
Liberdade ou prisão?
Criação para cobrar
Ou carícia para obrigar?
Amor é liberdade
Ou fim da privacidade de poder escolher?
Que amor você escolhe?
O que impõe, o que troca ou o que acolhe?
(Michelle Carvalho)
A vida é feita de relações, e estas são áreas que estou gostando muito de apreciar, vislumbrar e refletir…
Certa vez ouvi uma conversa entre mulheres falando sobre maternidade e uma delas afirmou que cuida muito bem do filho para que ele cuide dela na velhice, afinal, é para isso que ela está se desdobrando dando “do bom e do melhor” a ele, com boa educação, estudo rígido e muito amor porque ela não espera menos do que isso quando ela precisar – palavras dela.
Ouvi aquelas palavras como um estilhaço no meu coração. Aquela mulher estava criando um filho ou fazendo um investimento em prol da própria vida como uma garantia, uma previdência privada e afetiva? Aquela atitude demonstra um ato de amor ou uma moeda de troca?
Em outros momentos também vejo alguns filhos que abusam dos pais pelo simples fato de serem filhos. Beijam e acariciam os pais sempre com o intuito de pedir algo e serem tidos como “carinhosos”. Não dão atenção, não dão presença, não ouvem, não ajudam em casa, não cooperam. Ao mínimo sinal de negação de um desejo respondem com grosserias estapafúrdias, não dão valor aos estudos, ao conhecimento e aos momentos em família, agindo como pessoas que apenas demonstram carinho quando desejam algo em troca, ou nem mesmo assim, pois acham e pensam que todos os seus desejos tem de ser atendidos por obrigação dos pais.
Em ambos os casos faltam o equilíbrio, a descoberta do essencial, do amor que não espera troca. A bondade genuína é abnegada, ela simplesmente “é”, simplesmente realiza-se sem mão dupla, sem cobrança, porque a alegria da realização está em fazer pelo outro, não na expectativa da resposta.
Quando se ama com cobrança vemos interesse, amor como moeda de escambo, desvirtuando inequivocamente o real sentido de ser bom e de amar.
Esse dito amor sufocante dos pais que buscam a troca de obrigações precisas para uma futura velhice incide na alma dos filhos que crescem entulhados pelo peso e coação psicológica de “ter que ser daquela forma”, “ter que agir daquela forma” e “sentirem-se encarcerados a fazer daquela forma”, sem que seja espontâneo porque precisam “pagar” pelo amor que foi dado.
O amor dos pais para com os filhos é algo sublime e não condicional.
Impor condições para o amor é como encarcerar e enjaular as atitudes amorosas.
O livre arbítrio é o maior bálsamo que pode ser dado ao ser que amamos, pois sem ele subjugamos o outro a nos amar por coação, porque nos doamos, amamos e por isso o outro tem a OBRIGAÇÃO de amar de volta fazendo o que esperamos que faça. Que amor seria esse?
Um amor sem desejo de amar, sem liberdade e sim um “amor” forçado, um amor robótico, obrigacional, encarcerado, tóxico e aprisionador, que no fundo causa peso e dor por não ser espontâneo.
Deus é perfeito e sua principal lição é a da arte de amar na liberdade de ser, independentemente de erros e acertos, na presença ou na distância, porque quando amamos, o coração recheado de amor não é o do outro, é o nosso!! O transbordar da felicidade independe da troca porque o amor é assim, é pleno em si.
Quanto mais sufocamos o outro usando amor e doação como moeda de troca, privando o outro da liberdade de escolha, mais danos podemos causar à pessoa amada, pois o peso da cobrança externa eclode em um impulsionamento degradante de cobrança também interna, incessante, girando sem fim.
Por outro lado, caso deixemos estes filhos ignorados, abandonados, sem limites ou cuidados, sem amor, sem afeto, o resultado também é desolador por não se sentirem seguros pela presença, pela palavra de acalento e demonstração de que a mão da segurança está ali como esteio quando for preciso.
Como encontrar o fiel da balança entre amar sem sufocar e o distanciamento sem abandonar?
O caminho para chegar ao equilíbrio deve partir de uma análise interna do seu desejo para com o seu filho. Você o cria para obriga-lo a te amar ou você o cria para a liberdade de eleger estar contigo porque escolheu te amar?
Michelle Carvalho
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