Michelle Carvalho

Mundo Disforme

Mundo disforme

Que amigo você é

Na dor e no amor?

 

Que amigo você é

Na tristeza e no sucesso?

 

Você sabe compartilhar a alegria

Ou quando ouve algo de bom sucumbe em inveja e agonia?

 

Em meio a dor

Você julga ou acolhe?

 

Quem você é neste mundo disforme?

 (Michelle Carvalho)

 

Hoje vamos falar sobre felicidade, dor e julgamento…

Nossa! Como essas três palavras tão diferentes podem ter o mesmo cerne para serem ditas em um mesmo contexto?

Ah, isso veremos! E temos muito a falar!

Uma vez ouvi uma palestra do Padre Fábio de Melo na qual ele questionava em qual momento era mais difícil estar ao lado de um amigo, na alegria ou na tristeza?

Rapidamente respondi sentada em meu sofá: – Na tristeza, é lógico! Na alegria a gente comemora, come, bebe, ri, já na tristeza é difícil…

Mas o padre seguiu em sua explicação:

– Se prova a amizade verdadeira quando conseguimos estar ao lado de um amigo no momento em que ele está feliz, alegre, com sucesso, porque neste momento colocamos nossos próprios sentimentos à prova. Estar ao lado de alguém na tristeza é difícil, mas estar ao lado de alguém feliz e não sentir inveja é mais difícil ainda.

Na época eu achei essa explicação meio louca e não achava plausível, na verdade, acho que eu estava em outro momento da minha vida, com amizades que levantavam meu astral quando eu estava triste e que me deixavam bem, logo, não achei factível o que o padre havia dito.

Os anos se passaram e muitas mudanças vieram na minha vida. Tive dificuldades de estar com algumas pessoas na tristeza por não saber o que dizer naqueles momentos e não saber demonstrar o tanto de apoio que queria dar, mas no fundo, aquela sensação de não saber lidar com a dor do outro falava mais de mim do que deles, falava da minha necessidade de proteger, de não deixar sofrer, da minha impotência por não ter podido impedir a dor, por não saber lidar com o amor que eu estava sentido e não estava conseguindo demonstrar.

Conviver com o outro na felicidade sempre muito mais fácil, leve, o momento de me sentir vibrante por cada vitória de um amigo, na verdade, celebrar aquelas conquistas sempre me fizeram e fazem ter orgulho de cada um dos que me cercam e eu sinto aquelas coisas boas em mim também, como uma corrente do bem, do amor, da felicidade, da emoção. Sinto aquelas vitórias como minhas porque as pessoas que amo fazem parte de mim.

A pandemia nos fez viver coisas inimagináveis, nos fez repensar momentos, prioridades, mas também nos fez enxergar pessoas que deixaram “cair suas máscaras” mostrando sua real face que nunca foi vista no decorrer de muitos anos, o que nos fez estupefatos.

Assim também acontece quando temos uma grande e boa notícia em nossas vidas. Ao prolatarmos a notícia a algumas pessoas somos surpreendidos com as atitudes, alguns nos surpreendem de forma linda, outros nos decepcionam com atitudes negativas e com palavras que nos fazem repensar muito sobre o quanto somos ou não importantes para aquela pessoa.

Dar uma notícia boa e grandiosa é como viver uma nova pandemia na qual a real essência dos receptores do fato se mostra, e neste momento relembrei das palavras do Padre Fábio de Melo falando da dificuldade de algumas amizades estarem ao nosso lado em momentos de sucesso, alegria e felicidade.

Na verdade, analisando bem, vejo que a postura de algumas pessoas diante de momentos de sucesso ou de dor está intimamente ligada a sensação de poder e atos de julgamento e inveja.

Quando algumas pessoas estão diante da tristeza ou sofrimento do outro, sempre tem uma receita de vida – porque são donas da absoluta verdade-  (“você só vai melhorar quando fizer o que te falei”), um julgamento – porque apontam imperiosamente seus atos – (“isso só aconteceu porque você fez tal coisa”) e com isso demonstra a sensação de poder, de olhar o outro de cima pra baixo, de ser o “dono da verdade”, das “fórmulas perfeitas”, das “imposições corretas” que demonstram superioridade àquele momento.

Essas mesmas pessoas quando se deparam com o sucesso e felicidade alheia perdem o poder porque não conseguem mais olhar de cima pra baixo, não estão superiores, não sabem ser plateia e aplaudir quem tá no palco. Esse tipo de situação as fazem criar defeitos e frases como: “Conseguir assim é fácil, é cheio de regalias! Queria ver conseguir se tivesse que lutar como qualquer outra pessoa!”

Esse tipo de frase é impregnada de inveja e julgamento sobre o que se passa dentro da pessoa que profere tais palavras porque no fundo, ela se questiona sobre o motivo que a fez inferior, o motivo que a levou a não conseguir tal proeza ou o motivo que a fez não ter condições de chegar àquele patamar e isso a faz ridicularizar ou menosprezar a conquista alheia para não decair de seu “lugar de poder” ou de “julgador”.

Estar diante de pessoas assim nos faz repensar a vida, nos faz dar ainda mais valor a quem sorri ao teu lado nas tuas vitórias, das mais simples às mais grandiosas e nos faz afastar de quem não consegue ser feliz com suas alegrias como se delas também fossem.

É um trabalho árduo, doloroso e gratificante, tal qual trabalhar dentro de si para não deixar chegar dentro de nosso coração a inveja e o ato de julgar o outro.

Tantos amigos em meio as mais profundas dores que enfrentam em suas vidas conseguem um lampejo de luz em meio a sua tristeza ao receber a notícia da felicidade de um ente querido. Sentem-se revigorados como se a felicidade do outro caísse tal qual um bálsamo para ajudar em seu caminhar triste, impulsionando-lhe a seguir em frente, experimentando naquela notícia uma gota de amor em meio a um oceano escuro que começa a mudar de cor.

Outros são reconhecidos por não valorar a alegria alheia e por depreciar as vitórias com palavras amedrontadoras que decepcionam, afinal, somente nos decepcionamos com quem a gente ama.

Esses momentos são cruciais para que separemos o que cabe e o que não mais cabe em nossas vidas.

Quem é você diante de uma notícia de felicidade de um amigo?

Michelle Carvalho

e-mail: michellecarvalhoadvogada@yahoo.com.br

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Fonte imagem destacada: https://pixabay.com/pt/illustrations/disputa-alguns-homem-mulher-1959751/

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Michelle Carvalho

Biografia: Advogada, Escritora desde os 13 anos, com participação em inúmeras antologias literárias e premiações no Rio de Janeiro e em São Paulo. Ganhadora do Premio Baixada de Literatura em 2014. Lançou 4 livros: “Furor Letárgico da Alma” (2009), “Versos de Princesa Prometida” (2015 – na 17ª Bienal Internacional do Livro do Rio de Janeiro) e “Cindy Entre Patas e Reinos” (2018) e Cindy Entre Patas e Reinos 2 (2019 – 19ª Bienal Internacional do do Livro do Rio de Janeiro) , estes dois últimos projetos de leitura na Cidade das Artes/RJ, em várias escolas nacionais e internacionais. Além de diversas participações em projetos culturais literários em escolas com palestras motivacionais, intervenções literárias e poéticas em saraus, sendo o último deles o Programão Carioca da Rede Globo no ano de 2018, Participação na FLIM e FLISGO no ano de 2019, bem como posse na ACLAM – Academia de Ciências, Letras e Artes de Magé.

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