UM BRASIL QUE NÃO LÊ

     Como professor de literatura, envolvido com o ensino da mesma para jovens, é inevitável a observação de que elementos da contemporaneidade  afastam estes do  hábito de ler, o que   vai acarretar déficits em diversos aspectos, desde seu desempenho escolar à compreensão de mundo.

     Parece uma   observação   óbvia, principalmente para alguém que  atue  na área  da educação, ou um assunto recorrente, amplamente debatido, porém, evidentemente inesgotável, já que cada vez mais o uso e a  dependência   da tecnologia  digital se  sobrepõem a  capacidade  cognitiva do  ser, consumindo-o de forma implacável sem que reflita sobre tal.

     O déficit  de  leitura  do Brasil  em  relação   a   outros  países,  segundo  pesquisa da quarta edição da pesquisa  Retratos  da   Leitura  no  Brasil  desenvolvida   pelo  Instituto  Pró-Livro,    Itaú Cultural e IBOPE Inteligência, com dados de 2019, publicada na revista digital Pró Saber São Paulo em 9 de março de 2023 (https://prosabersp.org.br/acesso-a-leitura-ainda-e-desafio-no-brasil-como-formar-mais leitores/#~:text=Vo c%C3%AA%20j%C3%A1%20deve,do%20Sul%20(10).), revela  que  o  brasileiro  lê  uma média anual de 4,96 livros por habitante e que apenas 2,43 são lidos até o final. Países como a Finlândia tem números de 14 livros por ano, Canadá 14 e Coréia do Sul 10.

     A partir de dados como esse podemos embasar nossas reflexões sobre diversas questões que evolvem o comportamento   do  brasileiro   em  diversos   setores  do  tecido social, desde a nossa incapacidade de compreensão   e  interpretação  das  leis  que  regem  o   convívio,  até  as decisões que envolvem nossas escolhas políticas. Todas afetadas por nosso déficit de leitura.

     A educação é uma teia complexa, com muitos fios que se conectam, e o hábito de ler certamente é um desses. Utilizando a Finlândia como exemplo, os números que envolvem a violência se mantem em baixa já a alguns   anos,  mas nem   sempre  foi  assim,  algumas décadas atrás os gestores decidiram fazer da educação algo  que  interferisse  em  todos  os segmentos sociais, segurança, saúde, economia etc., e as consequências  dessa  decisão  se  mostram nos números que colocam a Finlândia num dos países mais seguros do mundo.

     No Brasil, essa falta de incentivo não é algo novo, entretanto, somando-se a falta de incentivo, hoje os dispositivos digitais, que não se nega que podem ser grandes aliados na propagação do hábito de ler, não são  usados  para  tal  intento. O professor  que  vive a realidade da sala de aula tem nos celulares ou nos Crome  Books  um  adversário  que  infelizmente mais atrapalha do que ajuda, por certamente, este aluno não  ter  uma  cultura  de  ler  constantemente, nem  noção  de seus benefícios, cabendo muitas vezes ao ambiente escolar promover este hábito, o que em muitos momentos torna a tarefa mais difícil.

     Sobre esta posição não existe consenso, o que certamente é muito bom, afinal o dissenso nesse caso contribui  para  a promoção  do debate, da reflexão. Como já disse, esse tema não tem nada de novidade, pode ser abordado  a partir  de aspectos  mais específicos e de forma mais profunda, porém, não é o que me  proponho  aqui. Num  primeiro   momento, a  ideia   é   que   tenhamos  um  olhar  para tal situação, a profundidade vem a reboque.

     “A leitura engrandece a alma”, esta frase dita por Voltaire, sob o olhar de alguns pode parecer clichê, o que de fato é aqui neste lugar, mas não dá para negar o fundo de verdade que ela carrega.

     Enfim, talvez falar disso seja óbvio, mas se for, viva o óbvio.

Link da foto em destaque: autoral

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