Elias Antunes

DO EXERCÍCIO DE VIVER, DE GOIAMÉRICO FELÍCIO

DO EXERCÍCIO DE VIVER, DE GOIAMÉRICO FELÍCIO

 

Por Elias Antunes

 

Este livro de poesia inaugura uma nova maneira de criação poética, na qual destaca a beleza dos achados e das palavras em si: a sonoridade e o significado, a mais das vezes, polissêmico.

O livro foi o vencedor do prestigiado Prêmio Hugo de Carvalho Ramos, de 1983, ganhando destaque e repercussão nos meios literários.

Esse modelo muito peculiar pode ter suas raízes em outro poeta, autor de um único livro de poemas, o também premiado José Décio Filho, o qual escrevia poemas muito livres, com temáticas várias, inclusive metapoemas, o famoso “Poemas e elegias”.

Deste seu “Exercício de viver” a poesia aparece em um crescendo, partindo dos dilemas e fantasmas interiores:

 

“Depois de tudo,

o que me sobra da sombra –

refúgio de mim,

refuto do resto –

é o lesto gesto

do pouco de mim.

 

Depois de toda contenda,

contido, burilo nos dedos

não mais o instrumento,

da morte, não mais a bússola

ao norte;

não mais espelho

a noite”

(…)

(FELÍCIO, 1986, p. 19)

 

Para se chegar a uma visão fraterna das pessoas, todas dentro de uma luta, seja contra os dilemas do sistema, seja contra as injustiças sociais:

 

“O DIA DA LUTA

 

Eu aqui, nesta terra

rica e inútil,

tendo como posse apenas

um sentimento amargo de perda,

assisto impotente

ao deambular de irmãos

desalojados de si,

pobres de tudo,

mas ricos de paciência.

 

Eu aqui, nesta terra

tão minha e estranha,

aguardo apenas o dia da luta.”

(FELÍCIO, 1986, p. 47)

 

Partindo para outro grande tema universal: o fim da vida física, o perecimento:

 

“VIAGEM

 

O cortejo segue lento

retardando atroz momento.

A multidão trafega triste

com seu fardo –

e a morte em riste.

 

O cortejo segue sempre

o seu coro pálido, em desalento.

 

O coveiro cava lento,

gesto duro frente a lamentos,

adiando o próprio dia.”

(FELÍCIO, 1986, p. 59)

 

Sempre importante buscar ler a poesia de ótima qualidade, com uma atenção voltada para o poder criador do poeta.

Goiamérico Felício, poeta de grande envergadura, construiu uma obra pouco extensa no universo poético, mas muito sólida e de presença exuberante.

 

Fonte da imagem: Foto do autor.

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Elias Antunes

Filho de um dos trabalhadores pioneiros que construíram Brasília, Elias Antunes nasceu em Goiânia, em 1964. Trabalhou como servente de pedreiro, vendedor ambulante, contínuo. Depois, entrou na Secretaria de Segurança de Goiás, por concurso. Bacharel em Direito, UCG, Mestrado (incompleto) em Teoria Literária, UnB. Em 1993, por concurso, entrou no Tribunal de Justiça do DF, passando a morar no Distrito Federal. Concomitantemente, foi professor do ensino médio e universitário de História da Filosofia, de Redação, de Direito e Legislação e de Teoria Literária. Seu livro de poemas “Chamados da Chuva e da Memória” ganhou o prêmio da Funarte de Criação Literária e o prêmio “il convívio”, na Itália (1º lugar). Seu romance “Suposta biografia do poeta da morte”, ganhou os prêmios: Hugo de Carvalho Ramos, 2008 (1º lugar), Prêmio Jabuti, 2011 (finalista), prêmio “il convívio”, na Itália (1º lugar). Tem 20 livros publicados e ganhou mais de 300 (trezentos) prêmios. Participa de mais de 100 antologias e obras coletivas no Brasil e no exterior. Cocriador das revistas O artesão, Rotina, Flor & sol e Linhas & Letras e dos jornais Tempoesia, Jornal de Poesia e Artefatos. Tem poemas traduzidos para os idiomas: espanhol, francês, inglês, esperanto, galego, romeno, italiano, catalão, alemão, sueco, russo e hindi. Com publicações nos países: Rússia, Itália, Argentina, Portugal, França, Estados Unidos, Espanha, Romênia, México, Suécia, Vietnã, Índia e Venezuela.

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