Era algo em torno das oito e meia da noite de terça-feira. Eu tinha acabado de conversar com minha tia por telefone, quando ouvi um barulho. – Trovoada? – Estava cética; afinal, se não me falhava a memória, havia ao menos um mês que não chovia. Meti a cabeça para fora, a fim de comprovar a suspeita. Parecia de fato trovão e o céu nublado confirmava a hipótese.
Dali a pouco, pingos grossos e esparsos começaram a cair. – É, tá chovendo mesmo. – A princípio, foi uma chuvinha tímida, sem personalidade. Em um quase nada, porém, engrossou e fui forçada, apesar do calor, a fechar as janelas, evitando os respingos que invadiam o apartamento.
Meu marido e eu corremos para resgatar a roupa seca no varal. – Droga! – Tínhamos esquecido os buracos na telha de policarbonato. Se não fôssemos rápidos, no dia seguinte, teríamos de lavar tudo outra vez, por conta da água poeirenta que invadia a área de serviço.
Se esse fosse todo o problema, beleza, mas, quase às nove horas, a luz apagou. – Tá de gozação! Nem choveu para tanto. – Não ficamos totalmente às escuras, contudo. Havia caído apenas uma fase. Estava garantida, assim, alguma precária iluminação e o funcionamento de certos aparelhos, em determinados cômodos da casa.
Pelo sim e pelo não, desligamos a maioria dos disjuntores e tiramos da tomada os equipamentos sensíveis, onde a corrente ainda se mantinha. É muito arriscado, vocês sabem, não se prevenir contra picos de luz em situações de volta de energia.
O que mais aborrece nessa história é o dèja vu. Recentemente, houve outro apagão desses. Um transformador da rua entrou em curto e pegou fogo. Levaram quatro horas para consertar. Agora acontecia tudo de novo.
Minha maior preocupação costumam ser as comidas congeladas no freezer e a perspectiva de dormir no calor. Fora isso, aproveito para ler e até consigo escrever crônicas. Mas, convenhamos, é muita falta de respeito. Numa sociedade dependente de energia elétrica, é inadmissível não haver investimento em linhas de transmissão, produção de energia, manutenção e modernização de equipamentos. Empresas enchem as burras de dinheiro, como se dizia no passado, mas, nas crises, quem paga o pato é o povo.
Enfim, faço coro com a indignação de muitos, sujeitos ao descaso e desmandos dos serviços. Meu consolo é que, não sendo eu uma inteligência artificial, posso deleitar-me com uma boa leitura e traçar, à moda antiga, a lápis, num velho caderno, estas linhas que digitalizei e oferto a vocês, caríssimas e caríssimos leitores. Bendito consolo analógico!


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