Erick BernardesHISTÓRIAS DE ARARIBOIA

Ponta D’Areia ou Portugal Pequeno?

Ia morrer sem saber que Portugal Pequeno é um certo trecho do bairro Ponta D’Areia. Incrível, impossível não perceber, a vida ensina mais do que aquela já conhecida instrução formal. Trabalhei de vendedor durante anos pelas ruas de Niterói e nunca imaginei que eram esses bairros os mesmos lugares. Exato. Nunca me questionei o motivo de as placas indicarem um espaço lusitano miniaturizado em vez apontar o real nome do bairro margeado pelas areias da Guanabara. Pois é, confesso, isso de fato me passou despercebido. Ponta D’Areia ou Portugal Pequeno?

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Lembro de quando meu amigo Sandro Cintra narrou para mim a história do seu avô Daniel e cuja imigração teria dado ao velho português o título de um dos primeiros moradores do bairro. Sandro, meu amigo, é hoje taxista e se rói de raiva quando um turista ou outro entra no carro ordenando: “Para o Portugal Pequeno, por favor!” Ao lembrar que esse nome foi dado à força de empreendedorismo turístico, o motorista me afirmou estar o próprio nome Ponta D’Areia caindo em esquecimento. Pois ninguém que vem de fora imagina ser este Portugal Pequeno uma sacada de administração pública com vistas a atrair turistas. Somente um trecho da localidade possui o referido nome português, o todo da Ponta D’Areia é ainda o antigo e charmoso bairro.

Assim que emprestei os ouvidos aos arroubos de patriotismo desse meu amigo, resolvi tirar a dúvida, pesquisei:  e não é que ele tem mesmo razão! Lá, onde realmente foi no passado certa colônia lusitana, abriga hoje alguns poucos descendentes patrícios e muita nostalgia. Histórias de além mar preenchendo o imaginário dos atuais moradores, isso é o que mais se ouve ainda por lá. Por isso, importa-nos reconhecer a preciosidade da narrativa oferecida pelo Sandro. Mas nada que uma rápida pesquisa não ajude também na confirmação do fato. De acordo com jornal O Globo, o ano foi o de 1998:

“[…] quando a prefeitura fez um projeto de revitalização do bairro, pegando como gancho o Encontro com Portugal, promovido pela Secretaria municipal de Cultura, e as comemorações pelos 500 Anos do Descobrimento do Brasil. O projeto incluiu a substituição do asfalto por paralelepípedos e a recolocação das pedras portuguesas no calçadão, além da pintura das casas à beira-mar, que receberam novas cores. Quatorze anos depois, no entanto, o bairro já mostra sinais de abandono. Mas, de acordo com a prefeitura, não há novos projetos de revitalização para a área” (BELMONT, 2012).

Enfim, vão-se as unhas ficam os dedos, pois o reduto criado tardiamente para homenagear os irmãos lusitanos ficou mais falado do que a tradicional Ponta D’Areia propriamente dita. No entanto, o lugar cresceu em importância turística, ao menos fez sucesso alguns anos atrás. Quer saber paradeiro do meu amigo motorista de táxi? Bem, esse vive ainda se aborrecendo com passageiros que (coitados!) querem chegar ao Bar do Bacalhau, em Portugal Pequeno, e não conhecem a história. Sandro Cintra defende o querido e antigo nome do bairro do qual o avô foi pioneiro na construção civil. Fica irritado, perde clientes para o sorridente condutor do Uber e põe a culpa na modernidade.

Referência: BELMONT, Mariana. “Bairro da Ponta D’Areia hoje tem poucos portugueses e descendentes”; O Globo, 07 abr 2012.

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Erick Bernardes

A mesmice e a previsibilidade cotidiana estão na contramão do prazer de viver. Acredito que a rotina do homem moderno é a causadora do tédio. Por isso, sugiro que façamos algo novo sempre que pudermos: é bom surpreendermos alguém ou até presentearmos a nós mesmos com a atitude inesperada da leitura descompromissada. Importa (ao meu ver) sentirmos o gosto de “ser”; pormos uma pitadinha de sabor literário no tempero da nossa existência. Que tal uma poesia, um conto ou um romance? É esse o meu propósito, o saber por meio do sabor de que a literatura é capaz proporcionar. Como professor, escritor e palestrante tenho me dedicado a divulgar a cultura e a arte. Sou Mestre em Letras pela Faculdade de Formação de Professores da UERJ e componho para a Revista Entre Poetas e Poesias — e cujo objetivo é disseminar a arte pelo Brasil. Escrevo para o Jornal Daki: a notícia que interessa, sob a proposta de resgatar a memória da cidade sob a forma de crônicas literárias recheadas de aspectos poéticos. Além disso, tenho me dedicado com afinco a palestrar nas escolas e eventos culturais sobre o meu livro Panapaná: contos sombrios e o livro Cambada: crônicas de papa-goiabas, cujos textos buscam recontar o passado recente de forma quase fabular, valendo-me da ótica do entretenimento ficcional. Mergulhe no universo da leitura, leia as muitas histórias curiosas e divertidas escritas especialmente para você. Para quem queira entrar em contato comigo: [email protected] e site: https://escritorerick.weebly.com/ ou meu celular\whatsapp: 98571-9114.

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