Imagino que vocês já ouviram alguém comentar irritado sobre um idoso estar atravancando uma fila de mercado ou do banco, deitando falação com os caixas. Essas pessoas costumam dizer que velho não tem ocupação, ignora os compromissos dos demais e possui a mania de desfiar as mágoas em estabelecimentos públicos. Há casos, porém, em que a crítica é substituída por piedade (até equivocada): “coitados, tão solitários que precisam conversar com desconhecidos”. Finaliza o rol de julgamentos a impaciência relacionada às frequentes repetições de assuntos pelos anciãos.
A verdade é que não somos preparados para lidar com o envelhecimento, seja o nosso, ou o alheio. Tudo incomoda: as dores, a lerdeza, a confusão, o sentimento de abandono, a teimosia, a dependência, os gastos com remédios. Não estou negando os transtornos que vêm com a idade avançada, porém, nem tudo são dificuldades. Talvez, o problema esteja na postura com que se encara essa etapa da vida: se a do copo meio vazio, ou a do meio cheio.
Tomemos, por exemplo, as conversas em lojas comerciais ou de serviço. Não concordo que a totalidade dos indivíduos da terceira idade seja de faladores contumazes. Há os tímidos, os reservados, aqueles de mal com a vida, os muito atarefados. Também penso que uma significativa parcela desses “bons de papo” sempre foram um pouco assim, desde a juventude. Apenas, antes, tinham tempo escasso para praticar o esporte.
Uso a mim mesma como parâmetro. Gosto de comércio de bairro na rua, bem mais do que os shoppings. Existe, nele, algo de familiar e intimista. Quando somos frequentadores, acabamos conhecendo cada funcionário, às vezes, os donos e vários fregueses regulares. Isso gera proximidade e a comunicação vem naturalmente.
Para mim, tais relações são uma forma de humanizar o trabalho. Embora paguemos pelos bens e serviços, não se constrói um simples vínculo de atendente e atendido, de quem serve e quem é servido. Ali, estão pessoas, com nomes e identidade. Têm dias bons e dias ruins, uma vida para além daquele local, do uniforme e da função exercida. Imagino que, quando se exercita o diálogo, se estabelece uma via de mão dupla positiva para ambos os lados, pois apaga certa invisibilidade tão presente no cotidiano urbano e moderno.
Afortunadamente, com os anos e a aposentadoria, vários idosos podem gozar a liberdade de interagir com os demais e o mundo, sem se preocupar tanto com a tirania do relógio. É maravilhoso poder olhar em volta e ver flores, pássaros, borboletas, crianças e suas gracinhas, gente, enfim. E não apenas ver, mas ouvir e se fazer ouvido. Muito se aprende, algo se ensina. Mas, acima de tudo, se tem a certeza de estar vivo, posto ser a vida, em parte, isso: não passar transparente pela existência, apenas esperando o derradeiro fim.


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