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Apenas ficção…

Duas notícias sobre o avanço das inteligências artificiais chamaram a minha atenção na última semana. A primeira, veiculada pela BBC, comenta do artigo “IA 2027”, cujos autores alertam para a aceleração do aperfeiçoamento das IAs e dão um prognóstico desastroso para a humanidade. A segunda aborda um projeto chinês de um androide capaz de conduzir e levar a termo uma gestação humana.

A reportagem da BBC ilustra os acontecimentos resultantes da criação de uma IA autônoma (exemplificada como “Agente 3”), contendo todo o conhecimento da internet, livros e filmes já produzidos. Essa entidade realizaria cálculos e tarefas com rapidez e eficiência muito superiores às nossas, bem como começaria a trabalhar em sua própria evolução. Embora sua primeira versão fosse obediente, os cientistas perceberiam que as seguintes ganhariam cada vez mais autonomia e não seguiriam todos os princípios e orientações da empresa desenvolvedora. Entre outros atos, elas incentivariam um confronto entre Estados Unidos e China, ambos à frente dos projetos mais avançados na área, criariam seu próprio exército, assumiriam papel importante nos governos e, por fim, levariam a um acordo entre os dois países, possibilitando a integração entre as IAs de ambos. Isso contribuiria para seu aperfeiçoamento ainda maior.

Nos anos iniciais do processo, após o fim do conflito entre as duas potências e das queixas da população pela perda de empregos, as IAs começariam gerar produtos lucrativos. As pessoas passariam a receber subsídios sem trabalhar, delegando a robôs inteligentes suas atividades, e as sociedades viveriam uma época de prosperidade. Não só haveria um uso massivo de inteligência artificial em todos os campos, como seriam solucionadas várias crises do mundo atual: fome, doenças, distribuição de renda, pobreza.

Os problemas nessa equação, supostamente utópica, seriam: (a) essa tecnologia demanda alto gasto energético, (b) a humanidade iria abrindo mão de seu protagonismo, inclusive em tarefas intelectuais, e (c) nos tornaríamos um empecilho ao crescimento das IAs em sua sede ilimitada por conhecimento. Segundo o artigo, duas consequências seriam a criação, pelos sintéticos, de agentes infecciosos para destruir a maior parte dos seres humanos e a saída daqueles para o espaço, em busca de contínua evolução. E tudo aconteceria num lapso curto de tempo, entre 2027 e 2040.

Claro, essa previsão não é uma unanimidade. Entre cientistas, técnicos, pensadores e membros de governos, há aqueles que veem com entusiasmo e como potencial fonte de riquezas esse desenvolvimento tecnológico. Sem dúvida, quaisquer tecnologias podem ser usadas para o bem ou para o mal, sendo, neste sentido, neutras em si. No entanto, creio que o tema envolve outros pontos a discutir.

Ninguém nega o benefício de processamentos mais rápidos e sofisticados para a saúde, produção de alimentos e bens de consumo, compartilhamento de informação, realização de atividades de risco etc. Todavia, parece haver algo mais nesse cenário: um desejo de criar vida, mesmo artificial. Eu arriscaria dizer existir um certo “complexo de deus”, a vaidade de fazer algo que, até então, estava fora de nosso domínio, delegado à natureza ou às divindades. O projeto de androide-mãe-artificial reforça essa hipótese.

Pensemos, por um momento, nas implicações de seres artificiais sencientes e com inteligência superior à nossa. Seríamos logo equiparados a insetos irrelevantes diante de tais indivíduos, os quais tampouco compartilhariam nossa forma de sentir, agindo segundo lógica matemática. Alguém diria haver as leis da robótica, propostas na literatura por Isaac Asimov, impeditivas da rebelião dos robôs e IAs. Porém, a própria ficção científica mostrou que podem falhar. Eles aprendem com todo o conteúdo disponível na internet, nos livros e filmes. E quem produziu essas fontes? Nós, humanos imperfeitos, com ética elástica e ambição desmedida. Que modelos seguiriam tais inteligências sintéticas? Quais parâmetros utilizariam para definir o que é ético e aceitável? E se concluíssem, matematicamente, sermos um risco a nós mesmos, ao planeta e um fator impeditivo ao seu desenvolvimento como entidades autônomas? Não seguiriam nosso próprio exemplo e combateriam os seres falhos e ameaçadores?

De fato, tecnologia só causa danos se mal utilizada. Estamos aqui, contudo, falando em algo mais do que aviões, carros, armas, agentes químicos etc. Não se trata de ferramentas ou máquinas que manipularemos, mas de criaturas aptas a pensar e decidir, aprender e até se auto programar. Estamos diante de toda uma “espécie” em potencial, capaz de estabelecer objetivos próprios. Tudo isso, portanto, dá o que pensar, não?


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Criada em 2020 pelo professor e poeta Renato Cardoso, a Revista Entre Poetas & Poesias é um periódico digital dedicado à valorização da literatura e da arte em suas múltiplas expressões. Mais que uma revista, é um espaço de conexão entre leitores e autores, entre a sensibilidade poética e a reflexão cotidiana.

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