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Poema e o Coração de Ney Matogrosso em Cena

Há músicas que são como cartas não enviadas. Outras são como oratórias silenciosas. E Poema*, na voz de Ney Matogrosso, é como um sussurro existencial. Uma narrativa que começa com o medo e termina na paz, atravessando a alma com delicadeza e coragem. O texto da canção é, na verdade, um roteiro emocional: da carência ao acolhimento, da dor ao significado, da busca à transcendência.

Eu hoje tive um pesadelo e levantei atento
A tempo
Eu acordei com medo e procurei no escuro alguém com seu carinho
E lembrei de um tempo

Porque o passado me traz uma lembrança
Do tempo que eu era criança
E o medo era motivo de choro
Desculpa pra um abraço ou um consol
o

Hoje eu acordei com medo, mas não chorei nem reclamei abrigo
Do escuro, eu via um infinito, sem presente, passado ou futuro
Senti um abraço forte, já não era medo
Era uma coisa sua que ficou em mim

De repente, a gente vê que perdeu ou está perdendo alguma coisa
Morna e ingênua, que vai ficando no caminho
Que é escuro e frio, mas também bonito, porque é iluminado
Pela beleza do que aconteceu há minutos atrás

Quando o medo pede colo

“Eu acordei com medo e procurei no escuro alguém com seu carinho”

Logo no início, encontramos o perfil de quem sente demais. Alguém que, diante do medo, não busca lógica ou solução, mas contato. Um afeto que abrace, que diga “tô aqui”.

O narrador é emocional, sensível, e encontra no outro o lugar de consolo. Como uma criança que, no escuro, chama pelos pais. Mas ao invés do choro, vem a memória: de um tempo em que o medo era desculpa para ganhar um abraço.

Esse primeiro movimento é marcado pela lembrança afetiva e pela necessidade de vínculo. O medo não é o centro: é apenas a porta de entrada para a busca de amor.

Do apego à consciência sensível

“Hoje eu acordei com medo, mas não chorei nem reclamei abrigo / Do escuro, eu via um infinito…”

O tempo passa dentro da música. E com ele, a maturidade também. O medo continua lá, mas algo muda. Não é mais um chamado desesperado. Não é mais carência, é presença. A pessoa ainda sente, mas agora também contempla.

O infinito não é mais ameaça, é possibilidade. E nesse movimento interno, o medo se dissolve — e é substituído por uma sensação de que algo (ou alguém) ficou.

Não ficou como corpo, mas como marca. Como luz. Como memória boa.

A saudade do que se foi, e ainda assim ficou

“De repente, a gente vê que perdeu ou está perdendo alguma coisa / Morna e ingênua…”

A canção fecha com uma percepção madura sobre o tempo e os afetos: algo está sendo deixado para trás. Algo que era leve, talvez simples, mas que marcou profundamente.

Essa percepção não traz revolta, mas beleza. É como se o caminho escuro e frio ganhasse brilho — não pelo que está à frente, mas pelo que já foi vivido. É um luto sereno. Uma consciência sensível.

Da carência à consciência sensível

Poema é um retrato quase perfeito da transição entre dois modos de sentir e existir. Começa com o Orador em dor — aquele que busca o outro para amenizar o medo, que precisa de afeto imediato, que associa segurança à presença física. E termina com o Visionário em recurso — aquele que contempla o que foi, compreende o que ficou, e transforma a falta em presença simbólica.

A música mostra essa passagem sutil entre dois estados: da dependência afetiva para a percepção madura de que alguns vínculos não precisam estar para continuar sendo. O que era medo vira memória; o que era busca vira poesia.

Poema é sobre atravessar a dor sem se perder nela. É sobre acordar com medo, mas não chorar. É sobre procurar colo e depois descobrir que o colo já ficou dentro da gente.

A canção começa com apego e termina com percepção. Começa com busca e termina com memória. Mostra um caminho emocional de quem um dia precisou muito do outro, mas agora aprendeu a levar esse outro como luz interna.

E talvez seja isso o que nos cura: quando a presença se transforma em paz. E o medo, em poesia.

Poema é sobre atravessar a dor sem se perder nela. É sobre acordar com medo, mas não chorar. É sobre procurar colo e depois descobrir que o colo já ficou dentro da gente.

A canção começa com apego e termina com percepção. Começa com busca e termina com memória. Mostra um caminho emocional de quem um dia precisou muito do outro, mas agora aprendeu a levar esse outro como luz interna.

E talvez seja isso o que nos cura: quando a presença se transforma em paz. E o medo, em poesia.

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Eu sou Camila Lourenço Covre, especialista em desenvolvimento humano e linguagem comportamental. Acredito que a comunicação é a chave para decifrar a alma humana e construir conexões mais profundas. Se você se interessa por esses temas, acompanhe meu trabalho no Instagram: @camilaslourenco.

*Composição: Cazuza / Roberto Frejat. 


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