Preso à rotina, o atendente da loja de produtos para animais domésticos, no verão escaldante de uma pequena cidade mineira, trabalhava arduamente. Não revelarei seu nome, nem o do pequeno estabelecimento. É apenas uma história cotidiana de um sujeito comum e num trabalho ordinário.
O homem precisava sobreviver, submetendo-se a humilhações e levando desaforo para casa. Há quem não aceita levá-lo para o lar de jeito nenhum. Mas alguns o trazem para o conforto residencial, tomam café com ele e ainda oferecem um quarto de hóspedes. Tudo por questões de necessidade. A vida é sobre quantos socos na cara você consegue levar até cair, não é mesmo? E atendente era bem resistente, como se verá ao longo da crônica.
Iniciava às 7h e acabava o expediente às 17h30. No horário das 15h, era a pausa para o café da tarde.
Na pausa para tomar um café quente e amargo, João Paulo observava os canarinhos na rua. Esse era o nome do funcionário. Poderia ser João ou apenas Paulo. Também Rodrigo, Timóteo ou Wellington. Todos nomes comuns. Mas vai João Paulo mesmo, visto que é um sujeito ordinário.
Observava como quem vê crianças inocentes brincando de futebol na rua em um fim de semana. A liberdade deles – pássaros e moleques – o fazia sentir inveja. Era uma liberdade que ele já não possuía. A infância acabou e o peso da responsabilidade veio montar em suas costas. Semelhante a um burro de carga. Já os passarinhos tinham asas. Voavam para onde queriam. Mas o vendedor não era como os pequenos pássaros da rua: vivia preso em uma gaiola para cantar.
Afinal, era um jumento ou um pássaro? Isso importa? Ambos servem de metáfora para o que escrevo. Só depende dos olhos de quem vê ou lê essa crônica, pois ambas as comparações são ótimas. João Paulo era uma mistura de ambos os animais: o burro, que carrega o peso de seu dono e o pássaro preso em uma gaiola fria e metálica, destinado a cantar também para a alegria do carcereiro.
Naquele momento, ele queria ser como os canarinhos e voar para bem longe da rotina. Ser um jegue era um fardo. Havia esse fardo e o peso da responsabilidade ou da demissão e, consequentemente, do desemprego e da fome. O dia a dia de João Paulo também se assemelhava ao de um passarinho. Mas não dos que se encontravam no horário de café, na rua: era igual ao dos que estavam presos, com as asas cortadas e obrigados a cantar eternamente para a satisfação de seus donos. Ele se encontrava preso, é verdade. Pelo menos tinha água fresca e comida dentro da jaula. No entanto, o atendente queria apenas voar em liberdade como as pequenas aves da rua.
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