Eu adormeço no fôlego da primavera,
concatenando ideias que fervem em água quente,
água escorrida do espírito ao papel.
Dormem as crianças na parte inferior da mocidade.
Dormem na dança encantada de um cervo de fogo, fúria,
deixando rastros de lágrimas, lastros
de esperma sagrado que concretiza o visceral na carne queimada
de um animal de fogo e fúria.
Eu adormeço no chão da primavera;
adormeço no local absoluto
da noite.
Estico a linguagem afogando pretéritos e ritmos
inventados e conhecidos somente pelo sonho.
Eu adormeço — e meço — nas alamedas
incongruentes, perniciosas, como um tambor mágico que
dita o transe possesso do meu coração
duas vezes pernicioso.
O homem foi feito para gritar:
somos o grito antropomórfico do universo.
Assim como uma linha divide a realidade,
tal é um peixe esbranquiçado parindo
um pedaço de oceano.
Mar. Álamos sintéticos de amores falsos.
Mar. Estremecem o fim das pétalas de um lírio. Mar.
Lirismo cético, intenso. O poema é uma música em
silêncio. O poema é o inverso da razão.
Mar. Porque o idioma das sinfonias se cala ao
compreender que a vida — ah, a vida —,
ela não tem direção, propósito, destino:
tudo é exatamente como deve ser: uma viagem
perpendicular e perpétua só de ida — onde trotam
deslumbramentos — que floresce.
Mar. Que vibra. Mar.
Que pulsa dentro e fora de ti. Mar.
Que é capaz de sorrir e amar — ágape.
Em uma expansão eterna que finaliza
à liberdade da alma através da veemência impelida
para fora de um corpo e para dentro do infinito.



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