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Projeto 16 horas – Edição: Mai.25 – Crônica – “Pachamama” – Cristina Vergnano

Embora a data tenha passado, aproveito maio como mês das mães para revisitar o tema. Apesar de parecer clichê, é uma matéria de forte apelo emocional. Muitos nunca conheceram suas mães biológicas, outros tantos já as perderam, porém, todas e todos fomos gestados e nascidos de uma mulher.

Existe, contudo, bem mais do que biologia sob o rótulo da maternidade. Pensei, por exemplo, em Pachamama. Essa palavra quíchua está formada por “mama”, cujo significado é mãe, mas, também, num sentido mais amplo, autoridade, e por “pacha”: universo, mundo, lugar e tempo. Portanto, poderíamos resumir Pachamama como a “Mãe da Existência”, afinal, gera todas as coisas e é senhora do tempo. Essa Mãe-Terra dá tanto a vida, o alimento, quanto os ciclos naturais, benéficos ou ruins. Entre os povos tradicionais e rurais andinos, é cultuada como divindade, celebrada em 1º de agosto, a quem se agradecem as dádivas da natureza.

Nossa relação com a Mãe-Terra, no contexto moderno e urbano, anda bastante degradada. Uma existência fundamentada na busca pelo lucro, exploração irracional de recursos e imposição de diferenças sociais vem-nos afastando dela e criando uma situação de risco à própria humanidade. A visão de uma Terra com atributos orgânicos, como uma entidade da qual somos filhos e, consequentemente, irmãos de todos os seres do planeta, nos escapa. Lembro-me, então, de São Francisco de Assis, cantando à irmã água, ao irmão sol, à irmã lua, ao irmão fogo, não apenas àqueles que consideramos seres vivos. Também recordo a inserção dos direitos da Natureza nas constituições da Bolívia e do Equador. Penso em como, no afã por conforto, progresso e avanços, esquecemos o quanto nossas ações causam morte e destruição dessa mesma Pachamama e de tantas mães (e demais pessoas) mundo afora.

Deixando essa perspectiva macro, voltemo-nos às mães no sentido estrito. A maternidade exige bastante e deixa diversas mulheres em situação de vulnerabilidade ou opressão, quando, por exemplo, precisam conciliar trabalho e família, enfrentar violência doméstica, ou criar sozinhas seus filhos. Nem sempre conseguem viver em plenitude essa escolha (às vezes, involuntária e imposta). Podem surgir, daí, abandonos, relações familiares fragmentadas, dores compartilhadas por filhas, filhos e mães. Não raro, tais circunstâncias são solucionadas ou remediadas por outras pessoas, ocupando o lugar da progenitora.

Desse modo, caberia perguntar: uma mãe é, de fato, apenas aquela que gera? O que dizer das avós-mães, das tias-mães, das madrinhas-mães, dos pais-mães? E sobre as profissionais dedicadas ao cuidado, amparo e proteção de crianças, cujo acolhimento preenche suas vidas com carinho e lhes fornece ensinamento e orientação? Nesse sentido, a maternidade se expande e ressignifica, conservando sua essência.

Ainda quando desconhecemos nossa origem, podemos encontrar mentoras, guias, amigas, inspiradoras que, mesmo sem contribuir com seu DNA, merecem o título de mães. No final do dia, não somos órfãos. Compartilhamos o seio de Pachamama, somos irmãos e precisamos resgatar essa fraternidade, a fim de romper fronteiras, abraçar o outro, reconstruir a vida. Por isso, vale a pena comemorar.

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Nota da autora: Esta crônica, aqui revisada, foi publicada em sua primeira versão no dia 08 de maio de 2024, na Entre Poetas & Poesias. Volto a publicá-la como um resgate de textos perdidos com a migração da revista para novo site.


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