Aconteceu no mês de abril dos anos 80, eu era uma adolescente que trabalhava no Centro do Rio de Janeiro e, no início da noite, atravessava de barcas a Baía da Guanabara para escola à noite no bairro do Ingá, em Niterói.
A maioria dessas viagens sobre as águas do Atlântico, essa menina estudava para as avaliações ou fazia deveres de casa; sentada em uma cadeira de madeira estreita com os cadernos no colo ou, outras vezes, sentada na escada.
Importante ressaltar que essa garota não estava alheia aos comentários acerca da política do país. A ditadura havia acabado, mas o autoritarismo ainda imperava no Brasil. Grande parte da população queria a liberdade de escolher seu presidente.
Foi durante o meu horário de almoço que observei pessoas nas ruas andando apressadas e em pequenos grupos. Algo bastante atípico. Voltei ao trabalho e na loja os funcionários comentavam que todos os comércios iriam fechar. Logo após o burburinho, ouvíamos o barulho das portas de ferro fechando rapidamente em sequência. Os supervisores nos dispensaram, subimos para trocar o uniforme e irmos embora.
O gerente geral já havia saído e o subgerente falou pelo alto-falante que devíamos ir para casa, principalmente, evitarmos as aglomerações. Sempre fui disciplinada, porém, naquela tarde, eu precisava ver de perto aquele movimento de estudantes.
Fui para o lado oposto ao meu trajeto diário, e uma grande emoção tomou conta de mim ao ouvir: “Vem, vamos embora, que esperar não é saber, quem sabe faz agora, não espera acontecer!”
Um mar de pessoas sorrindo e chorando, se abraçavam cantando uníssonas. Eu não conhecia absolutamente ninguém, fui abraçada também, pintaram meu rosto com tintas verde e amarela. Não havia xingamentos, nem violência. Somente bandeireiras que bailavam em harmonia sob o som da nossa voz: DIRETAS JÁ!
Ivone Rosa
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@profaivonerosa
abril/2025


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