Por Elias Antunes
O livro de poesia “Costura”, de Amanda Vital traz uma gama de poemas que estabelecem o ato de costurar, comparando-o com a criação poética.
As evocações à família, principalmente às mulheres (mãe, avó) e suas belas relações com as manifestações da natureza, compreendem a grandiosidade dessas pessoas para a nossa existência.
“mãe, hoje eu vi o mar: parecia um lençol de seda
que avó abanava e quando estendia sobre a cama
sempre ficavam algumas preguinhas ela precisava
puxar com cuidado deixando liso sobre o colchão
a maré também evita preguinhas por cima da areia (…)”
(VITAL, 2023, p. 27)
Os poemas trazem a forma de uma prosa, à maneira de um quadro expositivo do talento da poeta Amanda Vital.
O uso de minúscula mesmo onde deveria ser maiúscula, demonstra, também, a luta silenciosa, muitas das vezes, da mulher em conquistar seu espaço na sociedade e nas artes, em uma carreira merecida e justa. São como gritos silenciosos em que o ato que lhe resta seja consertar (costurar) as perdas e consequências das injustiças.
No poema “Confessionário”, por exemplo, podemos ler o que já vinha se revelando em sua escrita: esse tom confessional de seus poemas:
“minha verdade só entra pelas frestas: impaciente
e doida ricocheteando contra filtros teias bordas
como uma senhora agoniada nos fundos de uma
igreja junto à parede externa do confessionário a
chorar a sorrir com olhos fixos na barra da batina (…)”
(VITAL, 2023, p. 30)
O ato de costurar a que a sociedade impõe como trabalho feminino, porque supostamente subalterno (como o ato de cozinhar, já em outra proporção) revelam-se como trabalhos essenciais para a vida humana, que dizem respeito diretamente à existência e sobrevivência da humanidade.
Amanda Vital é sutil, não faz dessa poesia bela e sensível um campo de batalha, sobre a importância do respeito mútuo que as pessoas devem ter umas pelas outras para uma sociedade melhor.
Assim, fala da vida simples, das pequenas coisas cotidianas com que desvela a magnitude, pois são essas ações e ocorrências do dia a dia que fazem a grandiosidade da existência.
O diálogo com outros poetas, no texto de Amanda Vital mostram, ainda, que a realidade da mulher sempre foi bem outra, como no poema “Broto”:
“em 1965 joão cabral de melo neto dizia que a poesia
era como catar grãos de feijão que boiavam na água
nos tempos de vó não se catava feijão assim: sempre
era encher três mãos dentro do saco de juta despejar
tudo em cima da mesa e dedilhando pedra por pedra (…)”
(VITAL, 2023, p. 50)
Numa escrita com ares de confessional e que traz uma grandeza na própria sutileza de sua criação, Amanda Vital consegue traduzir em poesia as ações simples e diárias na vida das pessoas, mostrando sua verdadeira profundidade e necessidade.
É preciso dizer também que o livro “Costura” foi publicado pela Editora Patuá, uma editora que está transformando o mercado editorial do país, dando vez aos poetas, mormente, e escritores talentosos e criativos, com uma proposta revolucionária.
Belíssimo livro de poemas de Amanda Vital, “Costura” merece ser lido e apreciado por todos.
Fonte da imagem: Foto do autor.


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