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CARNAVAL NA RUA

Não consigo precisar a minha idade na época, porém eu ainda acreditava em coisas fantásticas! Quando uma grande caixa chegou à minha casa, levada pelo meu pai, ouvi minha irmã mais velha dizer: “vai ficar linda nela!” Não sabia o porquê, mas não me deixaram ver o conteúdo da caixa.

Dentro de casa, as músicas no rádio não deixavam ninguém esquecer as efemérides. Só tocavam marchinhas, e minha mãe sabia de cor todas elas!  Com o feriado prolongado e as várias brincadeiras com crianças vizinhas, acabei esquecendo de perguntar sobre a caixa. Até que chegou o dia para desvendar o mistério. Era uma fantasia indígena. Não era colorida, como sempre admirei. Havia um cocar comprido e uma saiazinha de penas brancas. Era tudo branco!

O passeio já estava combinado com a minha madrinha, uma carnavalesca nata, sempre muito animada! Minhas duas irmãs começaram a separar meu figurino. Meus cabelos eram longos e volumosos; gostaria de sair com eles soltos, minha mãe não autorizou. Fizeram então duas tranças e prenderam as pontas com fitas brancas. Queria calçar tênis… não deixaram! Fui de sandálias, rasteirinha, também branca. Imaginei que toda frustração seria compensada quando, finalmente, eu colocasse o batom. Ledo engano! “Criança não pode usar maquiagem!” Reprovou minha irmã do meio.

Minha madrinha levou: eu, meu irmão, suas duas filhas e um rapaz que era nosso vizinho. Com o calor, eu não estava nada confortável dentro daquelas penas brancas sobre uma camiseta também branca, acho que me tornei a pomba da paz, só faltava voar! [Com todo o respeito à minha avó materna – indígena]

Durante um pequeno intervalo, fiquei admirando a decoração da rua. Quando tudo já estava repetitivo, inclusive as músicas, comecei a chutar latinhas espalhadas pelo chão, de repente senti uma espécie de picada. Foi um corte por uma latinha amassada. O sangue escorria entre os dedos, sujando a sandália nova. Tentei esconder, mas já havia deixado um enorme rastro vermelho sobre os confetes e serpentinas no chão.

Meus amigos fizeram a delação. Pensei que minha madrinha fosse brigar comigo, ao contrário, ela ficou apavorada! Olhou ao redor à procura de uma farmácia, à distância viu que estava fechada. Entrou em um botequim e pediu no balcão:

– Moço, eu quero um copo da cachaça mais forte que tiver! Todos os homens presentes a olharam com espanto!  Ela explicou que era para um curativo, o dono do boteco nem se quer cobrou. Quando despejou a água-ardente (de fato, faz jus ao nome), chorei com a bruta ardência! Ela retirou a fita de minhas tranças e amarrou o ferimento.

Assim, voltei para casa mancando com a certeza de que nem toda festa tem um final feliz!

Ivone Rosa

@profaivoerosa

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