Vivenda Adolescente
Parte 1 – Anos 80, Flash
Saber voar como um super-herói.
Ficar invisível.
Ter poderes telecinéticos.
Ter superforça.
Ser indestrutível.
Aaah, quantas idéias fantásticas se entrelaçavam na cabecinha juvenil de nosso pequeno herói. Daniel, o nome dele. Danizinho, o chamavam. Ele não gostava muito, mas fazer o quê? Estava acostumado. Pardo, Cabelo crespo, nariz tipo batatinha, franzino, meio tímido, meio bobo. Muito inteligente, vivia pensativo. Amava juntar cacos e pedaços de qualquer coisa e criar seus próprios brinquedos. Vivia sonhando que sabia voar e quase sempre acordava assustado e extasiado com sonhos nos quais ele era tipo um super-homem, mas que sempre acabava perdendo seu poder de vôo. Suor no rosto. Queda livre.
O perído, meados dos anos 80, reservava os respingos da geração de 60 e 70 ao mesmo tempo que começara a embrionar lentamente uma geração que moveria e removeria conceitos nunca antes sequer imaginados pelas gerações anteriores. Época boa. Ou não, sei lá…
Nosso protagonista, no início da adolescência, experimentaria nessa altura – a aurora de sua vida – o que haveria de ser considerada pelas gerações posteriores como uma espécie de derradeira manifestação premilenarista no que tange a cultura pop, as artes, as descobertas e redescobertas… lá na frente, a internet e o domínio das redes logo ainda iriam mudar o cenário…mais ainda.
Mas adolescente é adolescente. Não importa a linha do tempo. Mesmos questionamentos, mesmas indecisões, mesmos caminhos, mesmas angústias. Só muda o endereço. E o Tempo.
Daniel cresceu acostumado a assistir o mundo em preto e branco. Que baita mudança quando a primeira TV em cores chegou em sua casa. Ele tinha uns dez anos. O mundo era colorido, cara. Ele não sabia! Não, não era preto e branco. E não havia seletor de canal na televisão (Seletor esse que o papai do Danizinho tinha um cuidado quase cirúrgico e sacramentado para girar e trocar de canal, senão “estragava o seletor” – dizia o paternal ) e no seu lugar, somente práticos botões que sintonizavam o canal escolhido de uma forma tão rápida e objetiva que ele nem acreditava. E a caixa do aparelho era de plástico. Imagina: Plástico. Nada de madeira aglomerada para ficar se desfazendo e sujando a casa. Incrível como aquela cor preta e cantos arredondados o faziam sentir-se no futuro.
Mas a velha TV preto e branco de 20 polegadas e caixa de madeira ainda funcionava. E, como um prêmio, foi colocada no quarto do nosso herói. Tá certo, a colorida era bem melhor, mas a colorida ficava na pequena e humilde salinha, pra família toda assistir. Se Danizinho quisesse assistir algo diferente no mesmo horário, ia pro quarto. Privilégio.
E não é que num desses momentos de gozo juvenil pela exclusividade solitária diante de uma tela de TV, que ele depara com cenas de um filme de viagem no tempo? Rapaz, a vontade de ver o filme em cores poderia ser satisfeita com alguns passos até a sala, mas o fascínio pela viagem no tempo não deixava ele pular da cama. Nem nos intervalos. Viu o filme todo em em tons de cinza. Mas o enredo o encantou.
Tá, ta certo que mais tarde, quando ele já se tornara um adolescente quase adulto, ele acabou vendo esse mesmo filme mais de um milhão de vezes. E colorido, claro. ”Caraca… o que eu faria se eu pudesse viajar no tempo?” – Pensava ele. Ele olha e pensa no passado. Olha pro presente. Descobre que o futuro o consome a cada instante. Muito rápido. É um flash. Fins dos anos 70, Início dos anos 90…
…continua.