O Conde do monte e o castelo de Niterói
Série: Histórias de Arariboia
Há pessoas que já partiram deste mundo há tempos, mas não tardam em aparecer em nossa imaginação. Não, não falo de fantasmas que voltam para nos perturbar o juízo, tais quais as almas penadas das lendas e mitos populares, como o Saci-pererê, que já foi moleque vivo noutras épocas; ou como a Mula sem cabeça das histórias de amor proibido entre padre e moça faceira. Nada disso, de jeito nenhum. Falo sobre o Conde Pereira Carneiro do Castelo da Armação, que me visita na mente, toda vez que atravesso a Ponte.
A lembrança do senhor Ernesto Pereira Carneiro e a sua vida de superimportância não passam ao largo da história fluminense. Lógico, a biografia é boa, trajetória histórica reconhecida, sucessos e beneficências ao longo da carreira de homem de negócio que foi – e variados elogios da imprensa mundial. Por falar em imprensa, publicaram naquela época (Jornal do Brasil, 1818): “O jornal do Brasil mostra força e recupera sua economia, tornando-se um dos jornais mais lidos da nação”, sob a visão moderna de Pereira Carneiro. Na sequência, o nosso visionário se lança às ajudas humanitárias. Verdade, um higienista, por assim dizer. Ou seja, preocupações sanitárias lhe dominavam doravante. Prova disso é que Pereira Carneiro foi um dos ricos e pioneiros a adotar novos métodos de higiene e “proteção dos seus operários, chegando a construir uma vila que levou seu nome, situada em Niterói, dotada de escolas”, a famosa Villa Pereira Carneiro.
Sua colaboração com as obras sociais da Igreja e a doação de uma substancial quantia de contos de réis, para auxiliar no combate à epidemia da “gripe espanhola” que maltratou o Rio de Janeiro em 1918, fizeram com que o papa Bento XV conferisse ao nosso personagem, no ano seguinte, o título de conde pelo Vaticano. Trata-se um dos membros fundadores da maternidade e do hospital dos tuberculosos da Santa Casa de Misericórdia de Recife. Sim, exatamente, figurão elegante e conde de fato. Há até um casarão com duas torres medievais nomeado de Palacete da Condessa. Um tipo de castelo miniatura. Seria um presente oferecido à esposa transformado em residência familiar? Não sei, ignoro essa e outras informações. Mas de uma coisa estou certo: rico, famoso e gente boa, ao menos o conde era considerado na opinião popular.
Está claro que esses assuntos de filantropia não ficavam só no papel. Além disso, coincidência ou não, o tema nos ter surgido à tona novamente revela somente a importância das pessoas se juntarem no combate às pandemias. Os ricos ajudarem os pobres; o respeito à saúde dos trabalhadores como foco de atenção e tudo isso combina bem. A Covid está aí. O fantasma é outro, mas o Corona mata tanto quanto a centenária Gripe Espanhola. Cadê os donos do capital de agora, onde se enfiaram as boas almas?
Enfim, vive-se ainda a fase das utopias. Busca-se saúde sem investimento, nossos fantasmas são os mesmos aos dos nossos pais, como diria a Elis Regina. Uma pena.
FONTE:
Boletim Min. Trab. (5/36); CÂM. DEP. Deputados; Câm. Dep. seus componentes, CONSULT. MAGALHÃES, B.; Encic. Mirador; GODINHO, V. Constituintes; Grande encic. Delta; HIRSCHOWICZ, E. Contemporâneos (1949); Jornal do Brasil (23 e 24/2/54; 14/4/76; 14 e 20/4/77 e 18/9/80); Tribuna da Imprensa (19/2/54).
Blog bairros.com
Crédito da foto: Carlos Ivan.