Erick BernardesHISTÓRIAS DE ARARIBOIA

Maceió: um bairro niteroiense

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Série: Histórias de Arariboia

Junto à região de Pendotiba, município de Niterói, o grande maciço costeiro se erguia virgem. Cresciam árvores belíssimas que jamais sentiram o golpe cortante de algum machado colonizador. Lá se encontrava a mata nativa onde as vegetações ostentavam suas formas, cujos riachos modestos deslizavam seus fluídos tranquilos.

Nas encostas menos acentuadas, antigas fazendas haviam sido abandonadas e que pertenceram outrora aos colonos portugueses que povoaram a região. Sim, duas ou três propriedades largadas ao léu sem sabermos por que e por quem. Ótimo, pensou Dona Marcela, quando o marido sorrindo apontou o fogão de lenha ainda intacto da construção abandonada. As famílias chegaram em Niterói por permissão não se sabe ao certo por qual comendador. Mas chegaram, isso que importa, e vieram cheios de disposição.

Lá em Alagoas não estava bom, o pouco da lavoura que conseguiram cultivar fora atacada por insetos chamados carunchos. Isso mesmo, um tipo de praga que dizimou lavouras por aí. Aquela Maceió nordestina foi um dia ambiente bacana, sentiriam saudades, mas aquele espaço diferente, ali verdinho a ser utilizado, causava boa sensação. Da antiga área ocupada antes do assentamento português havia funcionando somente a fazenda Piratininga. Resistia. Essa sim, produzia bastante e sobrevivia. Necessário então não tocar em chão algum. Claro, proprietário poderoso, daria ruim. No mínimo aqueles trabalhadores da terra alagoana tomariam uns tiros de bacamarte, se insistissem em tocar em algo da fazenda.

A contagem demográfica naquele dia sinalizava 9 famílias migrantes a se espalharem pelas cercanias dessa parte de Niterói. Se cada clã possuía no mínimo 5 integrantes, o leitor nem precisa calcular o tamanho da pequena sociedade que ali se formou. Claro, batizaram o espaço de Maceió, dado mais óbvio de apurar por causa da homenagem à terra natal. Plantaram mandioca, batata doce, hortaliças, banana, goiaba, frutas cítricas, enfim, havia de tudo um pouco. Até algum gado da raça Cafubá eles criavam. Isso mesmo, necessário haver animal rústico que desse conta da tração da moenda de farinha. As árvores retiradas para instalação de novas plantações viravam os carvões que constituiriam a segunda metade da renda desses esperançosos trabalhadores. Mas não deu, infelizmente a coisa foi decaindo e a agricultura familiar perdeu o seu espaço. Lucrava-se melhor com o carvão vegetal. Resultado? O desbaste da mata e a desvalorização rural da região niteroiense doravante nomeada de Maceió aconteceu.

De acordo com o site da prefeitura de Niterói: “até as primeiras décadas do século XX, a atividade econômica predominante era a agricultura de subsistência e a produção de carvão”. Viu aí, caro leitor! A narrativa que nos foi fornecida bate mesmo com as informações oficiais. Apenas os nomes de Dona Marcela e o senhor Justino ficaram gravadas no documento de compra e venda dos lotes dentre os quais precisaram urgentemente serem vendidos. Mas seriam documentos válidos, já que eles mesmos não pagaram um centavo sequer pelo assentamento? Não sei, confesso que não sei, se existisse máquina de viajar no tempo talvez ela desse conta do mistério. Mas o caso é que, “a grande maioria dos pequenos produtores não possuía meios de transportes para escoar a produção, certo intermediário, proprietário de carroças ou carro de carga, percorria os sítios nos quais recolhia o excedente comercializável e deixava outros produtos de caráter mais urbano”. Ele se revelou um agente de vendas ou mascate mais moderno, que se tornou comerciante importante, tão logo se fixou para os lados do Largo da Batalha.

Para quem não conhece, o bairro de Niterói ficou registrado por Maceió e traz consigo outros importantes sub-bairros: Santo Inácio, Viração, Castrioto e Paineiras. Além disso, bem perto do local há a Pedra de Santo Inácio, cuja geografia oferece uma reserva florestal cortada por trilhas lindíssimas que convidam a uma boa caminhada e ao deslumbre com a vista das paisagens. Agora você já sabe, não é? Maceió, migração, fazendas, enfim, qualquer semelhança toponímica jamais constituirá coincidência.

Marco limítrofe da Estrada Demétrio de Freitas, bairro Maceió, Niterói. Foto de Erick Bernardes

Referências: https://www.culturaniteroi.com.br/blog/?id=331&equ=ddpfan

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Erick Bernardes

A mesmice e a previsibilidade cotidiana estão na contramão do prazer de viver. Acredito que a rotina do homem moderno é a causadora do tédio. Por isso, sugiro que façamos algo novo sempre que pudermos: é bom surpreendermos alguém ou até presentearmos a nós mesmos com a atitude inesperada da leitura descompromissada. Importa (ao meu ver) sentirmos o gosto de “ser”; pormos uma pitadinha de sabor literário no tempero da nossa existência. Que tal uma poesia, um conto ou um romance? É esse o meu propósito, o saber por meio do sabor de que a literatura é capaz proporcionar. Como professor, escritor e palestrante tenho me dedicado a divulgar a cultura e a arte. Sou Mestre em Letras pela Faculdade de Formação de Professores da UERJ e componho para a Revista Entre Poetas e Poesias — e cujo objetivo é disseminar a arte pelo Brasil. Escrevo para o Jornal Daki: a notícia que interessa, sob a proposta de resgatar a memória da cidade sob a forma de crônicas literárias recheadas de aspectos poéticos. Além disso, tenho me dedicado com afinco a palestrar nas escolas e eventos culturais sobre o meu livro Panapaná: contos sombrios e o livro Cambada: crônicas de papa-goiabas, cujos textos buscam recontar o passado recente de forma quase fabular, valendo-me da ótica do entretenimento ficcional. Mergulhe no universo da leitura, leia as muitas histórias curiosas e divertidas escritas especialmente para você. Para quem queira entrar em contato comigo: ergalharti@hotmail.com e site: https://escritorerick.weebly.com/ ou meu celular\whatsapp: 98571-9114.

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