Michelle Carvalho
Tendência

Cartas

 

Cartas?????

Mero desabado

De um sentimento

Sofrido

Doído

Vivido

Ou meramente sonhado,

Escondido

Em voluptuoso jogo

De amor platônico

Onde uma alma vaga

Venerando, solitária

Pequenina

Em um amor imenso…

Transbordando

Em letras e lágrimas

Que umedecem e mancham

Muitas cartas de amor…

(Versos de Princesa Prometida – Michelle Carvalho)

 

Tem algo mais romântico do que cartas?

Se há eu desconheço!

Podem até proclamar que as rosas são mais românticas ou os chocolates em forma de coração, mas de que adianta receber flores e chocolates sem um cartão, um bilhete ou uma carta de amor?

As cartas tecem em suas linhas as emoções, a essência, o cuidado, a alma do apaixonado…

Eu sou suspeita em dizer, pois desde criança escrevia declarações de amor em meu diário, cartas aos namoradinhos que nem sabiam que me namoravam e, na adolescência, muitas cartas de amor nunca enviadas e engavetadas pra sempre.

Morava em uma rua distante do centro da cidade, rua esta que mal passavam os passarinhos e que qualquer barulho diferente era percebido facilmente.

Quando eu escutava o barulho da moto do carteiro meu coração explodia tal qual bateria de escola de samba e em um pulo eu corria ao portão para receber as correspondências na expectativa sonhadora de que algum admirador secreto havia de descobrir meu endereço e enviar-me uma carta perfumada com linhas amorosas que descreveriam um amor sem fim prometido até a eternidade…

É, essa carta nunca chegava, mas eu nunca perdia a esperança.

Certa vez, minha madrinha que morava na mesma casa que eu, vendo o quanto eu amava e esperava por uma carta endereçada a mim, escreveu uma e me enviou. Quando eu recebi aquele envelope com meu nome, meu coração floresceu em festa! Era sim uma carta de amor, de amor muito maior que qualquer um, um amor que reconheceu que aquele ato me faria feliz.

Relembro-me ainda de uma vez que recebi um telegrama enviado pelo meu pai no dia do meu aniversário, desejando-me “Feliz Aniversário”.

Naquela época era o único meio de entrega imediata e custava caro cada letrinha a ser digitada naquele papel a ser enviado. Eu era apenas uma criança e guardei por anos aquele premio que tanto significava pra mim.

Nestas pequenas delicadezas trazemos lembranças e marcas para sempre!

Correspondi-me com muitas amigas por cartas durante anos, mesmo já possuindo telefone em casa, mas a alegria da chegada da correspondência, a expectativa das respostas e da espera gestava a compreensão do tempo para as coisas acontecerem e amadurecerem dentro de cada um.

Destas esperas que engrandecem, sedimentam e constroem sinto falta tanto para mim quanto para muitos que entram e se perdem em um turbilhão de imediatismos.

O tempo das esperas se ausentou da vida cotidiana onde temos a modernidade ao nosso favor sendo molde de deteriorar nossa paciência.

É lógico que a celeridade em uma resposta para efetuar uma tarefa de trabalho, bem como um contato importante familiar é essencial, e quando não respondido de forma imediata gera uma ansiedade descabida e muitas vezes não compreendida, até mesmo para quem já foi da “era das cartas”.

Acho até mesmo que as correspondências físicas geravam mais respeito e solenidade, afinal, quem perderia tempo de enviar uma carta com cantadas baratas e chulas? No mínimo tentavam fazer a melhor caligrafia e colocar um versinho ou outro que ouviu em uma música bonita, não é?

Recordo quantas vezes fui ao correio postar as cartas e os cartões de natal para minhas amigas e meus professores nas férias. Gastava fortunas que já reservava para esta finalidade durante o ano. Hoje ainda faço questão de enviar cartões de natal para amigas especiais e tenho a alegria de receber mensagem delas dizendo que esse cuidado traz lembranças maravilhosas a elas.

Recentemente encontrei o carteiro que fazia entrega das correspondências na minha casa, hoje trabalha no balcão dos correios. Ele me reconheceu na hora, me chamou pelo nome e disse: “Michelle, a menina das cartas!”. Eu sorri e mostrei que estava levando algumas para postar. Ele sorriu e meu coração floresceu. É muito bom que algo assim marque minha história.

Coisas simples que deixam lembranças em mim e nos outros, nos unem em prol de algo bom, porque nos detalhes que nos reconhecemos, na imagem que causamos nos outros e enxergamos que nossas sementes de sonhos floresceram.

Que o tempo de esperas gerado pelas cartas retornem a nosso cotidiano para que tenhamos mais paciência com o próximo, com o que nos cerca e principalmente conosco, posto que a busca pela imediata resposta a tudo nos torna muitas vezes incapazes de ver alternativas diferentes que só advém quando temos tempo para pensar!

 

Michelle Carvalho

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Imagem destacada: https://pixabay.com/pt/photos/carta-envelope-flores-selos-1390463/

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Michelle Carvalho

Biografia: Advogada, Escritora desde os 13 anos, com participação em inúmeras antologias literárias e premiações no Rio de Janeiro e em São Paulo. Ganhadora do Premio Baixada de Literatura em 2014. Lançou 4 livros: “Furor Letárgico da Alma” (2009), “Versos de Princesa Prometida” (2015 – na 17ª Bienal Internacional do Livro do Rio de Janeiro) e “Cindy Entre Patas e Reinos” (2018) e Cindy Entre Patas e Reinos 2 (2019 – 19ª Bienal Internacional do do Livro do Rio de Janeiro) , estes dois últimos projetos de leitura na Cidade das Artes/RJ, em várias escolas nacionais e internacionais. Além de diversas participações em projetos culturais literários em escolas com palestras motivacionais, intervenções literárias e poéticas em saraus, sendo o último deles o Programão Carioca da Rede Globo no ano de 2018, Participação na FLIM e FLISGO no ano de 2019, bem como posse na ACLAM – Academia de Ciências, Letras e Artes de Magé.

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