Ezequiel Alcantara

Epístola sobre a Desvalia Mútua

Epístola sobre a Desvalia Mútua

 

“O que é o coração do homem?”

Goethe

Caríssimo e estimado poeta Ezequiel Alcântara, venho por meio desta carta expressar-lhe os meus sinceros agradecimentos pelo material poético que me enviou com a última carta. Não posso deixar de falar, o seu conteúdo é incrível! Ele diferencia-se do comum e tem uma essência única. Ah! O jeito que você fala do amor, da solidão, da adorada musa… Seus escritos têm muito a nos ensinar e refletir, por exemplo, quando diz: “Mas, quem poderá vir me dizer que não é verdade que meus dias são de trevas e que minhas noites são luz?” Fiquei extasiado. Poderá existir algo neste mundo que não seja arrebatado por sentimentos, certamente tão primorosos e nobres, inerentes ao coração que ama? A cada palavra de cada poema seu, mesmo que não chegamos a conhecê-la ou a víssemos realmente, é indiscutível para qualquer um que o ler, que a sua amada musa, Angelus Nigrum, é magnifique poésie!

Meu amigo, muito obrigado mesmo por me conceder tais experiências poéticas. Certamente a sua poesia revigora o sentir e transforma o modo como enxergamos a vida e, claro, o mundo. Não posso deixar de expressar o orgulho que tive quando li suas considerações sobre as minhas obras filosóficas que mandei, afinal, receber um elogio de vez em quando de pessoas que têm o conhecimento e afinidades com os assuntos abordados em questão, é ótimo. Ter reciprocidade é uma dádiva concedida a poucos.

Nós, os amantes da sabedoria, que buscamos incessantemente o conhecimento, observamos em coisas aparentemente comuns algo genuíno, que ora perturba e maravilha nosso ser. Foi assim que, lendo o seu monólogo, fiquei muito pensativo sobre umas questões humanas na sua fala: “— Por que nós, os escultores de nós mesmos, podemo-nos deixar que outros venham e tentem nos esculpir?” Refleti suas palavras e pensei que, talvez, nossos entendimentos comunguem dos mesmos ideais.

Coincidência, é certo que você não saiba, mas eu vivo procurando uma resposta para esse questionamento há tempos, porém, nunca encontrei uma adequada. Bem, talvez seja um pouco de senso comum que nós não devemos estar sujeitos às opiniões alheias e deixar-nos ser influenciados por elas. Mas é algo complicado, afinal, não podemos simplesmente ignorar ou deixarmos de ser afetados pelas palavras de outrem de uma hora para outra, sem sofrer nada.  Isso se dá porque somos tolos demais em ficar nos baseando no que os outros querem que nós sejamos e não no que somos de fato. Ou porque queremos agradar os demais para ser aceitos por eles e acabamos nos coibindo de nossa própria essência… Ah!… As pessoas são de uma laia terrível! Logo mais quando alguém vem e fala que nós não temos ou teremos valor algum, desvalorizando o que fazemos ou cremos. E, pensando mais sobre isso, vejo que quem é afetado por tais palavras ou discursos do tipo sofre de uma certa “desvalia mútua”, ou seja, correspondem a desvalia que recebem dos outros com mais desvalor consigo mesmo. Perdem-se no conhecimento de si e acreditam que os outros estão certos, flagelando a si mesmos com mais palavras de dor. É um atentado para consigo mesmo,  assim como você disse, “esculpindo a si” do jeito que não é para ser. Essa é mais uma das sagacidades cruéis que a vida nos impõe.

Peço que não se preocupe com todas essas questões, caro poeta, é só mais uma das reflexões desse velho louco, que se mete a querer ser filósofo. Que vive se misturando entre as complexidades dos sentimentos humanos. Sabe, é um saco as vezes, pode acreditar. Tem horas que reflexões assim me deixam indignado, desgostoso do real e da vida, pois retiram minha pouca paciência e me fazem passar tempos e tempos escrevendo sobre. Essas complexidades dos corações me perturbam o sono e também me excitam a continuar observando o ser humano. Provavelmente isso não vai me levar a lugar nenhum, já que não conheço a totalidade do ser como ele é (risos).

Deixemos para pensarmos mais sobre a mutualidade da desvalia uma outra hora, bem sei que nós dois passamos de vez em quando por essas situações em nossas vivências, e eu acabo relembrando momentos não muito prazerosos. Pois bem, sem mais delongas, muito obrigado sempre pela sua atenção, ficarei aguardando notícias suas e novos escritos seus. Receba os votos fraternos do seu velho amigo,

E. Fluvius Florense.

Estrasburgo, 14 de Fevereiro de 2021

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Ezequiel Alcantara

Olá, sejam todos bem vindos ao meu recanto poético! Me chamo Ezequiel Alcântara Soares, nasci em 28 de Julho de 2000 na cidade de Reriutaba no Ceará, onde me criei e vivi na comunidade de Riacho das Flores até o dia em que tive que deixar meu "torrão natal" e viver em São Gonçalo - RJ. Bem, sou apenas um ser humano, que foi se construindo ao longo do tempo, assim como uma colcha de retalhos, formado por luzes e trevas. Desde criança brilho o olhar pela poesia e pela escrita, com muito amor e carinho, o que resultou em cordéis publicados, participação em antologias poéticas e diversos escritos. Faço graduação em Filosofia pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e sou membro da União Brasileira de Trovadores (UBT) seção São Gonçalo. Este recanto visa apresentar poesias e textos que inspirem, através de minha poética, o mais nobre que há nos sentimentos humanos e que transcrevam, sutilmente, as estações do coração. Aproveitem! Que possamos amar profundamente, sejamos poesia!

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